
O governo do Estado anunciou nesta quarta-fera (13/10) o fim das aulas remotas e o retorno obrigatório às aulas presenciais na rede estadual e nas escolas particulares. Os municípios, no entanto, podem adotar medidas mais restritivas e garantir que o ensino remoto continue nas escolas municipais e particulares. Pais relatam receio de mandar os filhos para escola, principalmente aqueles abaixo dos 12 anos de idade, não vacinados. A Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) estuda medidas judiciais contra a decisão do Estado.
O Consórcio Intermunicipal que reúne as sete cidades ainda não fechou uma posição sobre o assunto. O RD procurou as prefeituras da região sendo que Santo André e São Bernardo já falaram sobre o alinhamento da sua estrutura municipal à diretriz do Estado. São Caetano e Ribeirão Pires não definiram ainda, enquanto Diadema fará um decreto próprio. Já Rio Grande da Serra e Mauá não se posicionaram.
Nas redes sociais, pais relatam o receio de mandar os filhos para escola, tanto por comorbidades das próprias crianças como pelo receio de os filhos se contaminarem e trazerem o vírus para casa. A moradora de São Bernardo e mãe de quatro crianças em idade escolar, Carolina Lauro de Morais é contra o retorno presencial. Ela tem uma menina de 14 anos e um rapaz de 12 que estudam em escola do Estado e uma menina de 9 anos e um menino de 7 na rede municipal. Apenas a de 14 anos tomou a vacina, o de 12 deve tomar no fim de semana.
“Eu achei um absurdo, a sensação é que nadei dois anos para proteger os meus filhos e estou me afogando na praia. Meus filhos têm asma e eu não consegui nem marcar uma consulta no posto para pegar um laudo atualizado pois eles não aceitam o que eles têm. Na sala da minha filha, em apenas uma semana de prova, foram confirmados dois casos de covid e eles simplesmente não avisaram os outros pais, apenas afastaram as crianças”, conta a mãe.
Carolina diz esperar que os municípios do ABC não sigam o Estado na imposição das aulas presenciais. “Me sinto impotente, sem voz, porque não temos direito de escolha pelos meus próprios filhos”, lamenta. A mãe disse que se a escola disser que seus filhos podem perder o ano por não irem presencialmente ela diz que vai optar pelo saúde em primeiro lugar. “Se eles preferem que meus filhos, que não têm uma nota vermelha e entregaram todas as lições nas datas, repitam de ano por isso, que assim seja”, completa.
Pai de um rapaz de 14 anos que estuda em escola particular de Santo André, Antônio Carlos Assis, também criticou o anúncio do Estado. “Decisão descabida, sem propósito real, colocando em risco várias crianças e adolescentes, frente a uma situação que ainda estamos vivendo diariamente. Não temos nem completado o ciclo de vacinas dos mesmos e temos uma decisão unilateral do governo forçando o retorno das aulas presenciais. Desrespeito total para com pais e responsáveis por menores de idade, demonstrando total autoritarismo por parte dos governantes”, disse. Assis considera que o governo deveria também não acredita que faltando menos de dois meses para o fim do ano letivo a obrigatoriedade do ensino presencial vá mudar alguma coisa. “O governo deve primar em trabalhar na base da educação e não falar que a pandemia atrasou o ensino e de dizer que voltar neste momento traria algum êxito”.
Professores
Para a professora Maria Izabel de Azevedo Noronha, a professor Bebel, presidente da Apeoesp, classificou a decisão do governo como irresponsável. “Os números da covid estão em queda, mas não dá para cantar vitória, isso pode causar até um rebote no número de casos, que é o que preemos que pode ocorrer. Além disso faltam apenas dois meses de aula, não sei se isso vai mudar alguma coisa para os alunos que já estão há mais de um ano no ensino remoto”, avalia.
Para a presidente do sindicato as escolas do Estado não têm condições físicas para garantir o isolamento e o distanciamento de 1 metro. Bebel disse ainda que a Apeoesp estuda meios de garantir a aula online para os pais que não se sentem seguros em mandar os filhos para a escola ainda, e também garantir a segurança dos professores e outros funcionários das escolas.
A professora Janaína (nome fictício) dá aulas em escola municipal de São Caetano. Ela trabalha com alunos especiais, que em geral não usam máscaras. Considera um grande risco de saúde para alunos e professores a decisão do governo. “Precisava de um protocolo bem elaborado, e coisas que não existem porque a escola é uma rotatividade grande de pessoas então não tem essa prevenção de vírus. Na escola em que eu trabalho, desde a volta em julho, já tivemos mais de cinco salas fechadas por casos de covid, e os alunos ficam suspensos 15 dias, mas nós professores continuamos a trabalhar. Essa questão de distanciamento é balela, isso não existe, porque as salas de aula estão lotadas, até 30 alunos em sala, não tem como manter distanciamento em sala. Voltaram as aulas porque não tem suporte de dar aula presencial e online. Os professores estão ficando doentes”, diz Janaína, que não revela seu nome real por receio de represálias.
Ainda segundo Janaína com menos de dois meses para o fim do ano letivo os alunos não terão ganho algum na parte educacional. ”As aulas terminam na primeira semana de dezembro e já estamos na segunda semana de outubro, então não faz sentido. É pouco tempo, o ganho educacional não vai acontecer, exceto um ganho social e emocional de ver pessoas e conversar. Os professores não estão dando conta do ensino online e do presencial e como o Estado e os municípios não querem contratar mais professores é mais fácil e barato colocar todos na escola”, completa.
O que dizem os médicos
Especialistas ouvidos pelo RD dividem opiniões. Ambos concordam com a necessidade dos alunos voltarem ao convívio com colegas e professores e também que o isolamento trouxe problemas psicológicos, mas discordam quanto à segurança, mesmo com a vacinação avançando.
Para o pneumologista e professor da Faculdade de Medicina do ABC, Elie Fiss, o retorno é necessário. “Acho que é uma medida que já era esperada. No meio universitário praticamente todo mundo já voltou ao presencial sem aumento do número de casos. A taxa de transmissão está extremamente baixa e caindo, número de casos novos vem caindo e internações também. O retorno presencial é extremamente importante e eu acredito que seja um bom momento para resgatar aquela proximidade dos alunos. Eu não vejo um grande risco não. Vamos, aos poucos, quebrando o isolamento que as crianças tanto tiveram. Com ambiente ventilado, uso de máscara e com professores vacinados é bom para recuperar o que perdido em sociabilidade dos alunos”, opina.
Já a infectologista Elaine Matsuda considera que o número de mortes no País ainda preocupa. “Ainda cai um avião por dia e as crianças hoje são o maior risco de manter a epidemia porque ainda não estão vacinadas. Voltar o ensino médio em que os alunos já começaram a vacinar é uma coisa, agora criança pequena é outra. Faltam só dois meses, será que não seria melhor manter o ensino híbrido?”, indaga. Para a médica, outra questão que deve ser levada em consideração é a estrutura das escolas. “O que as escolas fizeram para melhorar a ventilação e diminuir o risco? A gente sabe que o álcool em gel é o de menos. Foi feita avaliação de risco se aquela criança que está voltando para a sala de aula é aquela que tem maior risco de segurança alimentar ou maior risco de violência doméstica? Então essa volta presencial melhora as coisas só para a escola. Eu vejo muita escola que os alunos vão e acontece de um caso de covid e depois todos ficam 15 dias em casa, então eu diria que ainda é uma situação que preocupa”, conclui.
Prefeituras
Das prefeituras do ABC, São Bernardo e Santo André decidiram que vão seguir o Estado na obrigatoriedade das aulas presenciais. Veja a seguir o posicionamento das prefeituras:
São Bernardo: “O município seguirá as diretrizes estaduais para o retorno presencial obrigatório dos estudantes. A rede municipal de ensino conta, atualmente, com cerca de 82 mil estudantes. O município cumpre, desde o retorno das aulas presenciais, rigoroso protocolo sanitário para evitar a contaminação pela Covid-19, sendo o distanciamento de um metro um dos métodos adotados, além de uso obrigatório e oferta de máscaras para alunos e profissionais, entre outras ações”.
Santo André: “A Prefeitura seguirá as recomendações do Plano São Paulo. Atualmente, as unidades escolares do município realizam atendimento presencial em quatro dias da semana. Um dia da semana é destinado ao atendimento remoto. A partir da próxima segunda-feira (18), a rede municipal passará a atender presencialmente nos cinco dias da semana. O atendimento poderá atingir até 100% da capacidade da sala de aula, respeitando o limite mínimo de um metro de distância entre os alunos. A necessidade de escalonamento para o atendimento presencial das unidades de ensino dependerá da capacidade física de cada sala de aula. As unidades de ensino continuarão a ofertar atividades presenciais e atividades não presenciais (atividades impressas ou assíncronas), caso haja necessidade de atendimento por escalonamento. Santo André seguirá todas as determinações impostas pelo Plano São Paulo, conforme tem sido feito desde o início da pandemia. Portanto, as escolas particulares deverão seguir este padrão”.
Diadema: “O município vai publicar Decreto próprio para organizar a rede municipal de ensino: 61 escolas e 28 creches conveniadas. A quantidade de alunos na data base do Censo 2021 é de 31.800 estudantes na rede municipal. Haverá a opção para a realização das atividades não presenciais, nas quais os estudantes terão à disposição conteúdo para estudo ou atividades para fazer em casa. Escolas particulares seguem o que orienta o Plano São Paulo do Governo do Estado. A Prefeitura vai fiscalizar a rede municipal e conveniada. Já a fiscalização das escolas estaduais e particulares será atribuição do Governo Estadual.
São Caetano: “Após a publicação em Diário Oficial do retorno obrigatório às aulas presenciais, analisaremos o contexto de nossas escolas e daremos as orientações sobre a Rede Municipal de Educação e as que estão sob nossa jurisdição, o mesmo vale para as escolas particulares. Hoje a rede municipal conta com cerca de 22 mil alunos. Os protocolos sanitários serão mantidos, as escolas particulares que são de nossa jurisdição ( Ed. Infantil) já seguem nossas orientações, as demais devem seguir a Diretoria de Ensino de São Bernardo”.
Ribeirão Pires: “A Secretaria de Educação de Ribeirão Pires informa que aguarda publicação de resolução do Governo do Estado com o detalhamento das normativas para o retorno ao ensino presencial obrigatório. A partir da publicação e análise dessas normas é que a Secretaria de Educação estabelecerá as diretrizes relacionadas à obrigatoriedade de alunos no ensino presencial nas escolas municipais, especialmente quanto à data e de que modo se dará esta mudança. Todo este processo, como acontece desde o início deste ano, será feito com o acompanhamento do Conselho Municipal de Educação e com transparência para a comunidade escolar”.