
Sem consenso entre grupos de moradores do bairro Centreville, em Santo André, a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) deve iniciar no próximo mês a etapa de negociação individual com as 1.287 famílias que residem na área. A empresa pública espera ao fim de fevereiro pela liberação, por parte do cartório, das escrituras dos imóveis, para em seguida dar o próximo passo de diálogo com os proprietários das moradias.
À espera pela legalidade dos imóveis desde 1982, quando houve a ocupação do bairro, o Centreville avançou nas tratativas com a CDHU, proprietária legal da área, pela transferência de posse das residências, que não estão nos nomes dos moradores. Entretanto, a forma de pagamento pelos imóveis chegou a travar as negociações e dividiu a Associação União e Luta dos Moradores do Centreville.
A proposta da CDHU propõe que o morador pague pela residência 15% de sua renda mensal em até 30 anos, sob preço por metro quadrado em R$ 367,66. Se a prestação exceder o percentual, a companhia paulista subsidia a diferença. A partir da regularização fundiária e divisão dos lotes por parte da Prefeitura de Santo André, a empresa espera pelas escrituras em seu nome, para negociar contratos individuais com moradores.
Entretanto, uma ala dos moradores do Centreville defende que o pagamento se dê por 10% pelo valor venal do imóvel e mais 5% referente à documentação do título de propriedade. A situação causou racha na Associação União e Luta dos Moradores do Centreville. Defensor da proposta da CDHU, o então presidente do movimento, Tarcísio Calé, deixou o grupo. Em seu lugar, assumiu a suplente para vereadora, Marilda Brandão (PMB), contrária às diretrizes estabelecidas pela empresa paulista e a favor do pagamento pelo valor venal.
“A nossa linha é lutar para que o valor seja o combinado anteriormente e não aceitar imposição da CDHU e da Prefeitura. Queremos pagar pelas nossas casas, mas de acordo com a nossa realidade. O percentual de 15% de nossa renda é inviável. Ficamos tristes com a saída do Calé, que está sendo usado pelo governo (andreense) para convencer os moradores a fecharem esse negócio”, afirma Marilda.
Um dos líderes da ocupação da área há 35 anos, Calé fundou outro movimento, a Associação Pró-Regularização do Centreville e diz que a sede da nova entidade já atendeu cerca de 300 famílias que querem fechar acordo com a CDHU dentro dos moldes estabelecidos. “A gente é a favor da legalidade. Após anos de luta, temos um acordo com a Prefeitura, CDHU e os moradores, mas a Marilda criou um caso político”, aponta o representante.
Secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, Fernando Marangoni (DEM) afirma que a proposta do grupo de Marilda é ilegal, por contrariar as normas para habitação de interesse social. O responsável pela Pasta diz que o programa do governo federal Minha Casa Minha Vida tem o mesmo parâmetro de pagamento por meio de renda, e não por valor venal, e cita que a proposta da CDHU é ainda mais vantajosa.
“O grupo da Marilda tem motivação política e é ligado ao PT e PCdoB, diferentemente da associação do Calé. Por que ninguém (da Associação União e Luta dos Moradores do Centreville) reclama do Minha Casa Minha Vida, que cobra de 30% a 35% da renda do mutuário e tem variação de juros anuais de 5% a 9,16% por faixa de renda? A CDHU cobra no máximo 15% da renda e os juros para todas as faixas são de 4%”, contrapõe o secretário.
Desdobramentos
Tanto Marangoni como Calé acreditam que na medida em que a CDHU colocar em andamento as negociações individuais, a ala opositora perderá gás. Por sua vez, Marilda assegura que lutará na Justiça para que os atuais termos da empresa não se concretizem e promete presença com outros representantes do movimento na Câmara de Santo André, na sessão do dia 22, em protesto contra o governo andreense.
Histórico
A área que posteriormente veio a se tornar o Centreville era pertencente à Novaurbe S/A Comércio e Construção, que construiria ali um empreendimento imobiliário. A empresa, porém, faliu e as ocupações tiveram início em 1982. Quatro anos depois, o ex-governador de São Paulo Franco Montoro (PMDB) – falecido em 1999 – decretou a área de interesse social e de posse da CDHU.