
Santo André tem mais capacidade de armazenamento do que necessita, ainda assim qualquer que seja o problema, obra, falta de energia ou a simples redução de pressão, os moradores são duramente afetados, ficando dias sem água. Segundo o Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André), a capacidade de reservação, é de 101.706 m³ de água, divididos em 16 reservatórios. O PMSB (Plano Municipal de Saneamento Básico) realizado no ano passado pela autarquia apontava que o ideal para a demanda deste ano seria a reservação de 92 mil m³, para atender aos 716 mil habitantes, ou seja, a cidade tem mais capacidade de armazenamento do que o mínimo necessário, ainda assim sofre imediatamente com qualquer interrupção por parte da Sabesp, de quem compra água no atacado.
A engenheira civil, doutora na área de Saneamento Ambiental e professora na UFABC (Universidade Federal do ABC), Camila Clementina Arantes, chama atenção pela a necessidade de planejamento e que, ao que parece, Santo André fez a lição de casa. “A quantidade de reservatórios e o volume destes, bem como a distribuição espacial dos mesmos pela área do município dependem do planejamento efetuado pela prefeitura e pela prestadora do serviço. O plano municipal de saneamento básico (PMSB) é uma das ferramentas de planejamento, e de maneira bastante simplificada pode ser entendido como um estudo técnico que ‘faz uma fotografia’ do sistema no presente (diagnóstico) e, baseado nesta ‘fotografia’ e em
estudos que indicam a quantidade de água necessária para atender a população dentro de um intervalo de normalmente 20 anos, necessidades e metas que nortearão projetos e ações são estabelecidas. O PMSB deve ser revisto periodicamente, e no caso de Santo André, a revisão foi efetuada em 2018”.
Para a professora o nível dos reservatórios determina o atendimento, ou seja, as sucessivas crises que a cidade vem sofrendo, com diversos bairros afetados, demonstra que os esses tanques não estão trabalhando na sua plenitude. “O volume de água bruta presente nos reservatórios é um dos indicadores que sinalizam se a demanda será ou não atendida, mas um sistema de abastecimento de água eficiente é resultado de um conjunto de fatores, como a adoção de medidas para redução de perdas e a possibilidade de integração dos sistemas de abastecimento”. Essa situação pode ser explicada pela vazão de água que a Sabesp envia. Segundo o Semasa são necessários 2,2 mil litros de água por segundo, mas recebe cerca de 1,3 mil l/s. Já a Sabesp diz que manda 2.170 l/s. “A Sabesp envia regularmente a Santo André a quantidade de água suficiente para o atendimento da população do município”, diz a estatal em nota.
O Semasa anunciou em janeiro a reforma do reservatório Erasmo Assunção, localizado no bairro de mesmo nome. Os serviços de melhorias devem durar cinco meses. O equipamento tem 20 anos de uso e é a primeira vez que será realizada uma manutenção completa, que inclui restauração das chapas metálicas, dos guarda-corpos e das partes danificadas, pintura e jateamento interno e externo. A autarquia também vai iniciar, ainda neste primeiro semestre, a reforma do reservatório Vila Vitória. Ao todo, a autarquia vai investir cerca de R$ 2,5 milhões nas melhorias.
As perdas no sistema, basicamente formadas por vazamentos em redes antigas são, literalmente, as grandes sangrias do sistema e onde as empresas que produzem ou distribuem água devem concentrar esforços. “Chamo atenção para o controle de perdas, já que no Brasil perdemos em torno de 38% de toda água tratada, enquanto há países que perdem menos de 10%. O maior volume se perde já na rede de
distribuição, após o tratamento, quando já houve gastos com captação, tratamento e distribuição, sendo, portanto uma perda de recursos hídricos e financeiros”, analisa a professora da UFABC, que também aponta a conscientização sobre o uso da água um item importante, que pode evitar desabastecimento. “A adoção de práticas de reuso de água e aproveitamento de águas pluviais pelos consumidores quando
tais alternativas se fizerem viáveis, naturalmente respeitando os critérios de qualidade para o uso previsto e adotando as medidas de segurança necessárias. A população também pode contribuir, evitando o uso de água potável para a lavagem de pisos e rega de jardins; implantando equipamentos hidráulicos eficientes, como torneiras com arejadores e bacias sanitárias com caixa acoplada que conte com mecanismo dual flush e efetuando manutenções periódicas nas instalações hidráulicas de suas residências”, aponta.
No meio da confusão há uma dívida que gira entre R$ 2,5 bilhões e R$ 4 bilhões
A crise hídrica na cidade pode vir de vários fatores ou da associação de vários, seja de falta de investimento no combate às perdas, seja por receber menos água no atacado, seja pelo alto consumo, mas o fato é que há uma dívida enorme entre a empresa municipal e a estatal. O Semasa admite uma dívida de R$ 2,5 bilhões e a Sabesp cobra R$ 4 bilhões de Santo André. Nenhuma das partes associa a conta devida ao desabastecimento, mas é uma triste coincidência.
O prefeito Paulo Serra (PSDB) tem se movimentado politicamente para resolver a questão da falta de água. Ele falou diretamente com o governador João Doria (PSDB) sobre o assunto na última semana e a expectativa é que tudo estaria resolvido até domingo (03/02), mas a chegada da água nas casas é lenta e ainda não abastece todas. O presidente da Câmara, Pedrinho Botaro (PSDB) disse, em entrevista ao RDTv, que não acredita que a dívida seja causadora de problemas no abastecimento das casas dos andreenses. “Não se pode punir uma cidade por causa da dívida. Se fosse assim a cidade já estaria sem água faz tempo. O prefeito foi na quarta-feira da semana passada na Secretaria de Recursos Hídricos do estado. Ele também se reuniu com a bancada para explicar a situação”.
Em nota, o Semasa informou que há negociações em andamento. “O diálogo com a Sabesp desde o início da atual gestão tem sido aberto. A companhia estadual está com uma nova direção e o governo municipal tem feito reuniões com seus diretores desde janeiro. As propostas, porém, ainda estão sendo formatadas por ambos os lados”. A Sabesp nada informou sobre as negociações.