
Se cada um dos 57 km do trecho sul do Rodoanel Mário Covas falasse, fatalmente lembraria das moradias existentes no local antes da obra. Doze anos depois da saída destes moradores, a voz deles continua a ecoar pelo local, pois, ainda aguardam um posicionamento da Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A) sobre as indenizações para que possam conseguir um novo lar. Após manifestação ocorrida no último dia 7 de agosto, grupo dos mais diversos municípios segue em compasso de espera e com a esperança de conseguir um local para chamar de seu.
Representantes de mais de 200 famílias foram ao encontro dos representantes da autarquia estadual, ligada à Secretaria de Logística e Transportes, para saber dos encaminhamentos de cada caso. Quando chegaram ao local, no bairro Itaim Bibi, na Capital, encontraram um cenário de dificuldades para a resolução do problema.
“Chegamos lá e fomos tratados como se fossemos animais. Tinham sete carros da polícia nos esperando na porta. Eles lacraram a entrada e não nos deixaram esperar no lado de dentro e só pode subir um grupo de quatro pessoas para falar com eles. Chegaram lá (na reunião) e enrolaram, falavam que só tínhamos dado a opção de (indenização com) dinheiro e que precisávamos liberar outras opções”, explicou Vanessa Brito de Carvalho Apolônio, de 27 anos, moradora do Jardim Zaíra, em Mauá, mas que há 12 anos morava no Jardim Oratório, exatamente em um dos locais em que a pista do Rodoanel está localizada.
Estagiária em Pedagogia, Vanessa relata que em 2008 a Dersa ofereceu uma carta de crédito no valor de R$ 110 mil com a validade de seis meses, porém, sem encontrar qualquer moradia com tal valor, o prazo expirou. Na sequência foi oferecida a participação em um sorteio de moradias populares na cidade, porém, eram 80 vagas com 360 famílias na disputa. A moradora não foi contemplada. E agora mora em uma casa cedida pelo sogro até que possa encontrar sua casa própria para morar com o marido e o filho de três anos.
Além de moradores do ABC, o grupo também engloba pessoas de outros municípios como Itapecerica da Serra como é o caso de Gisleine Damião da Silva, 35 anos, operadora de caixa, que passou por uma história parecida. “Chegaram a oferecer uma casa em Mauá, em São Bernardo, mas acabei não indo. Me arrependo disso, mas depois ofereceram um sorteio para outros locais, mas todos muito longe e é difícil sair do emprego, tirar o filho da escola para morar muito longe”, explicou.
Sobre a indenização, tanto Gisleine quanto Vanessa alertaram que existe uma tentativa de obter R$ 157 mil para cada família, porém, até o momento não se sabe quando haverá uma resposta. Inclusive foi relatado pelo Dersa, segundo as entrevistadas, que a pandemia do novo coronavírus também atrapalhou a resolução do caso.
Outro problema relatado por ambas é sobre o auxílio-aluguel no valor de R$ 450. A reclamação é que tal benefício é pago de maneira atrasada, com uma média de atraso de três meses e chegando a quatro meses em alguns casos, fato que atrapalha a vida de algumas famílias que sofrem pressão para o pagamento dos aluguéis e suas atuais moradias.
Resposta

A reportagem entrou em contato com a Dersa relatando as denúncias e pedindo esclarecimentos. Sobre as indenizações, a autarquia relata parte das famílias pleiteiam um benefício em dinheiro e outra parte em outras modalidades. “Estão sendo analisadas a construção de novas unidades, aquisição de unidades prontas e a aquisição direta por meio de carta de crédito”.
Sobre os motivos que levam a não resolução dos casos após 12 anos, a autarquia relata que das mais de 7 mil famílias que entraram nos programas de reassentamento, 6,6 mil acordos foram fechados. “A maior parte dos beneficiários optou em receber indenizações pelas benfeitorias erguidas em áreas que pertencem a terceiros”. Outros optaram por uma unidade habitacional e outros pela carta de crédito, e um outro grupo renegociou os valores das indenizações. Em nenhum momento foi relatado sobre os problemas de negociação com as cerca de 400 famílias restantes.
Em relação aos atrasos do auxílio-aluguel, a Dersa negou qualquer dívida com aqueles que estão cadastrados. “O compromisso assumido pela Dersa/Governo do Estado de São Paulo é de manter o repasse do auxílio moradia até o cumprimento do atendimento habitacional definitivo”.
Segundo as entrevistadas, não houve a judicialização do caso, pois, “nenhum advogado quis entrar com uma ação contra o Estado”.