
Com a abertura, pela Câmara de Mauá, da CEI (Comissão Especial de Inquérito) para investigar a postura da Enel em relação aos consumidores, já são quatro câmaras entre as sete cidades da região que abriram procedimentos de investigação contra a concessionária de energia, todas por conta do aumento exagerado nas contas de luz, cortes e dificuldade do consumidor contestar os valores lançados nas faturas. A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) de Santo André já deliberou que vai convocar representante da Enel para depor, mas a data ainda não foi definida. A Enel sustenta que ainda não foi chamada pelas câmaras para responder às críticas e diz que o número de reclamações tem caído.
Para a diretora do Procon de Santo André, Doroti Cavalini, a abertura das comissões de investigação nas câmaras vai ajudar na pressão que vem sendo feita sobre a Enel desde o ano passado, quando os problemas ficaram ainda mais graves por conta da pandemia da covid-19. “É de suma importância a colaboração dos vereadores para unir forças e lutar pelos consumidores. A Enel não pode continuar agindo assim, essa união chama a atenção para o problema mostrando que não é uma situação isolada. Juntos podemos chegar até a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) que regula o setor e pode tomar providência pelo descumprimento de contrato. A participação das câmaras, mais os Procons regionais e o Procon do estado só mostra que o consumidor bateu em todas as portas e pediu ajuda a todos os órgãos”, analisa.
Em 2020, somente o Procon de Santo André encaminhou representação ao Ministério Público baseada em 1300 atendimentos daquele ano. Segundo Doroti Cavalini, a promotoria de justiça relatou que esse procedimento seria juntado a um inquérito civil que já estava em andamento. “Agora, neste ano até o início de setembro, já tínhamos mais de mil novas reclamações. Já estamos com uma representação pronta para encaminhar ao MP novamente e só estamos esperando dar o prazo de resposta de mais 138 reclamações para fazer o encaminhamento”, anunciou Doroti.
A Enel sustenta que a quase totalidade das reclamações sobre o valor das contas são improcedentes. “A companhia identificou mudança no perfil de consumo e comportamento dos clientes, observando que 74% das reclamações ingressadas pelos Procons associados ao ABC, estão relacionadas ao tema de faturamento, porém, após análise 90% são classificadas como improcedentes”, informou a empresa em nota.

Câmaras
A CPI da Enel mais antiga da região é a de Santo André, aprovada no dia 4/8. Ela é a que tem mais tempo e maior andamento até o momento. O vereador Renatinho do Conselho (Avante), que preside a comissão, disse ao RD, que foi aprovado pela comissão nesta terça-feira (28/09) a convocação da Enel para dar explicações aos parlamentares andreenses. “Aprovamos a convocação, mas ainda não temos uma data definida”, afirmou. Segundo o parlamentar, a CPI já pediu documentos ao Procon, ao Consórcio Intermunicipal e outros órgãos, mas o mais importante é o depoimento de moradores. “As contas são abusivas, tem uma senhora que mora no Bom Pastor, numa casa de um cômodo, sem televisão e chuveiro. Ela pagava R$ 57 e agora veio uma conta de R$ 800. Isso fora o serviço de péssima qualidade, como não fazer medição e tirar a conta pela média. Ontem (28/09) estive na agência de atendimento da Enel, lá é tudo terceirizado, não tem diálogo, oferecem parcelar em 12 vezes ou corte; tem muita coisa obscura”, diz o vereador.
Renatinho relatou ainda que está correndo pela cidade um abaixo-assinado através do qual ele pretende juntar assinaturas para pressionar os deputados estaduais a também abrirem uma CPI da Enel na Assembleia Legislativa. “Eu já tenho 4 mil assinaturas e pretendo conseguir até o final do ano 30 mil. Vou entregar no gabinete do deputado Campos Machado porque não podemos permitir que essa situação continue, os deputados têm que agir também”, diz.
O vereador de Diadema, Eduardo Minas (Pros) autor do requerimento que gerou a criação da CEI da Enel em Diadema no início deste mês, disse que nesta quinta-feira (30/09) serão conhecidos os membros da comissão. Como autor ele deverá presidir os trabalhos. “Pretendo movimentar a Câmara e abrir um canal de denúncias. Eu estive com um grupo de moradores da avenida Prestes Maia, no bairro Taboão, que ficaram entre segunda-feira e quarta-feira sem energia, comerciantes e empresas tiveram grandes prejuízos. As queixas vão de cobrança abusiva, ausência de manutenção na rede e instabilidade. Tenho caso de uma consumidora que tinha uma conta de R$ 300 que depois se comprovou que era R$ 26. É preciso nos unirmos com o Procon e o Judiciário”, disse.

Até as disputas partidárias naturais da câmara ficaram de lado diante das reclamações contra a concessionária de energia. “A Enel conseguiu unir a oposição e a situação contra ela justamente porque passou dos limites. Na CEI vamos buscar conseguir robustez de documentação”, resume Eduardo Minas.
O caso do morador de Diadema, Francisco Alves Pereira, é um dos exemplos. Por causa de uma cobrança da Enel, que ele sustenta ser indevida, ficou com o nome sujo na praça. “Furtaram o relógio da minha casa que eu alugava, fiz o boletim de ocorrência e a Enel instalou outro, só que quando instalaram passaram a cobrar um monte de contas atrasadas que não são minhas, aí sujou meu nome. A Enel já veio aqui um monte de vezes para cortar e eu não deixei, ameacei chamar a polícia e eles foram embora”, disse o consumidor.
Pereira conta que cansou de tentar uma solução e que está com o nome negativado há cinco meses. “Não estão mais me mandando contas, há dois meses o valor já estava em mais de R$ 1 mil, sendo que a minha média mensal gira em torno de R$ 150. A gente reclama e eles só sabem dar número de protocolo, mas solução nenhuma”.
Regional
O presidente da CPI da Enel de São Caetano, vereador César Oliva (PSD), disse que a comissão está analisando ponto a ponto a gravação da audiência pública realizada em abril com a Enel para fazer novos questionamentos à companhia e ele já adianta que esses questionamentos serão mais incisivos diante da situação que não melhorou. “Essa semana estamos fazendo esse levantamento de quatro horas de gravação, vamos questionar tudo o que foi colocado, o que foi prometido e não cumprido. A situação só piorou, a inflexibilidade de negociação continua, as denúncias de consumo alto, a qualidade do serviço e do atendimento é ruim. A Enel é uma unanimidade, não só na câmara, em qualquer lugar, é só sair na rua e perguntar para qualquer um o que acha do serviço da Enel”, diz o parlamentar que avalia ser inevitável a convocação de representantes da empresa para dar explicações.

Oliva avalia que os vereadores integrantes das quatro CPIs instaladas no ABC podem juntar esforços numa força-tarefa regional para cobrar providências da Aneel e da Assembleia Legislativa. “Acho que é possível uma reunião regional com os membros das CPIs para trocar informações, isso pode acontecer nas próximas semanas quando já tivermos uma documentação na mão. A Câmara de São Caetano já deu um recado em abril na audiência pública para falar que o serviço não está legal. Agora com a situação pior vamos querer explicações, queremos dar um basta nisso porque a Enel demonstra que não é humana, que só quer lucrar”.
O que diz a Enel:
“A Enel Distribuição São Paulo esclarece que está ciente dos trabalhos das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI’s), mas ainda não foi convidada oficialmente para participar das audiências públicas nas Câmaras Municipais de Santo André, São Caetano, Diadema e Mauá. Em relação às cidades de Diadema e Santo André, a distribuidora recebeu questionamentos por ofícios, que serão respondidos no prazo determinado.
A empresa reforça, ainda, que cumpre todas as normas às quais está submetida. Os serviços de distribuição de energia no Brasil são regulados e fiscalizados com base em Legislação Federal, e regulamentados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Estas normas têm natureza técnica, comercial e de atendimento ao consumidor que orientam os procedimentos da Companhia e de todas as distribuidoras de energia elétrica no Brasil.
No primeiro semestre deste ano, a distribuidora registrou redução de 36% no volume total de reclamações ingressadas no ABC, Região Metropolitana de São Paulo, em comparação ao último semestre do ano passado.
No mesmo período, a companhia identificou mudança no perfil de consumo e comportamento dos clientes, observando que 74% das reclamações ingressadas pelos Procons associados ao ABC, estão relacionadas ao tema de faturamento, porém, após análise 90% são classificadas como improcedentes. A distribuidora ressalta que houve uma redução de quase 50% no volume de reclamações dos clientes sobre falta de energia entre 2016 e 2020, considerando o consolidado dos diversos canais de atendimento da concessionária, como o call center, a agência virtual e o aplicativo. Apenas entre 2019 e 2020, a queda nas reclamações sobre falta de energia foi de 8,4%”.