
As famílias que já foram selecionadas pelo programa Sihab (Sistema de Habitação) da prefeitura de Santo André com recursos do Programa Casa Verde Amarela (antigo Minha Casa Minha Vida) estão desamparados, sem contrato com a Caixa e ainda sem saber quando o empreendimento será construído. As obras deveriam ser início em abril, mas até agora nada foi feito. Cerca de cem famílias já foram selecionadas para a compra dos apartamentos de três dormitórios com financiamento pelo programa federal de habitação tendo a Caixa como agente financeiro. O banco, que tinha aprovado o empreendimento em 2019, agora avalia que o custo de construção inicial não é mais viável e não contratou a obra.
A auxiliar de comunicação Camila Milena Vitor, de 27 anos, foi selecionada em setembro de 2020 tendo satisfeito todos os critérios colocados para participar do programa habitacional. Ela diz que assinou com a construtora Sousa Araujo e o seu processo parou na fase de assinatura de contrato de financiamento com a Caixa. “A construtora tem feito reuniões, mas ela diz que não pode fazer mais nada, que o problema é entre a prefeitura e a Caixa. A gente liga no telefone de informações do Sihab e ninguém atende o atendimento online também não funciona. Segundo a construtora a Caixa diz que o valor do imóvel, de R$ 133 mil é muito baixo”, explica.
No site da prefeitura de Santo André, na aba Sihab, o empreendimento João Ducin continua anunciado como disponível e recebendo inscrições. Para se enquadrar no programa habitacional a família tem que ter renda de R$ 465 a R$ 3.135. “Tem gente que está segurando, ganhando pouco e não pode se arriscar porque se ganhar um pouco a mais que o teto fica fora do programa”, explica Camila.
Outro que conta os dias para ter sua casa própria é o auxiliar de TI, André Morais, de 39 anos, que está desempregado. Nascido e criado em Santo André ele deseja muito a sua casa própria e quer que ela seja na sua cidade natal e encontrar a oportunidade de compra dentro de sua capacidade financeira e no município que deseja fez com que ele e a esposa depositassem todas as suas esperanças do Residencial João Ducin. “Quando assinei o contrato com a construtora, meu filho foi e viu a maquete do prédio. E ele já imagina como será o prédio, todo azul, e como vai ser o quartinho dele. Eu não tenho o que dizer quando ele me pergunta quando vamos mudar para o prédio azul, isso corta nosso coração”, diz Morais.
O auxiliar de TI mora de aluguel não muito longe do numeral 300 da estrada João Ducin, local previsto para a construção do empreendimento. Para ele o condomínio é sua única chance de sair do aluguel e ir morar num bom apartamento e em boa localização. “Com a nossa renda é pagar aluguel ou morar de favor o que eu nunca quis para nós”, disse. Ele se inscreveu no programa em 2018 e esperou até o início deste ano quando foi chamado em uma solenidade no Teatro Municipal. “Disseram para nós ‘Agora é seu e ninguém tira mais’, isso ficou na minha mente e nos encheu de esperanças, mas a gente passa lá e dá desânimo ver o terreno parado. Chegaram a colocar um outdoor no local, mas depois foi retirado”, conta.
O projeto do Residencial João Ducin prevê 236 unidades na primeira fase e outras 224 na segunda fase. Os apartamentos seriam divididos em quatro blocos. As unidades são compostas por três quartos, sala, cozinha, área de serviço e sacada. O condomínio prevê quadra poliesportiva, pista de caminhada, horta, bicicletário, salão de festas e playground. O empreendimento fica em terreno bem localizado, no Jardim Cristiane e a pouco mais de três quilômetros do Centro.

Prefeitura
A prefeitura explicou que buscou inovar criando um programa de incentivos para empreendimentos habitacionais no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida, do Governo Federal, vigente na época. A ideia era diminuir o déficit habitacional “O poder público poderia selecionar empresa do ramo da construção civil em procedimento próprio e, após seleção, elaboração de projeto, licenciamento do respectivo projeto arquitetônico e seleção de demanda, assinar contratação com o agente financiador (Caixa) para somente assim começar a construir. E assim foi feito, houve procedimento de seleção de empresas, obedecendo todas as legislações pertinentes, onde a construtora sagrou-se vencedora. Por razões de enquadramento do empreendimento, no PMCMV as famílias beneficiárias deveriam respeitar referido patamar de renda familiar bruta e por disposição do agente financiador (Caixa) as unidades habitacionais para esta faixa salarial seriam de R$ 133.000,00 (cento e trinta e três mil reais) e tal disposição foi condição para enquadramento do referido empreendimento no PMCMV, conforme o programa federal estava em vigência através do programa Federal MCMV Faixa 1.5 (infelizmente hoje extinto, pelo atual Governo Federal)”, diz a prefeitura em nota.
Ainda de acordo com a administração municipal a Caixa aprovou o empreendimento em 2019 e então a prefeitura buscou recursos também do programa estadual Casa Paulista Apoio, mas é a Caixa que faz a análise de risco do empreendimento, verificando se a empresa privada/incorporadora terá condições de começar a obra e terminar a obra. “Infelizmente devido à pandemia, e com o passar do tempo e grande alta dos valores do material de construção em 2020 e 2021 o valor que estava sendo proposto pela prefeitura, de R$ 133 mil (para que os moradores de Santo André pagassem por este valor) ficou desatualizado, na avaliação da Caixa. O banco alega que a unidade habitacional por este valor se tornou inviável. A Prefeitura de Santo André tem tentado há meses sem sucesso que a Caixa deixe o privado construir e vender por R$ 133 mil, mas o banco não aceita. A Caixa alega que assinar contratos com tais valores é assumir risco de obra e ela não se coloca neste risco”, relata a nota da prefeitura andreense.
A prefeitura diz ainda que desde março de 2021, quando a Caixa não aprovou o LAE (Laudo de Avaliação de Engenharia) do empreendimento junto ao privado/incorporado com o valor sugerido pelo certame (de R$ 133mil), está negociando juntamente com o incorporador, o Governo do Estado, o Governo Federal e Caixa para resolver o problema. “A Prefeitura de Santo André tem lutado muito pelos munícipes para viabilizar o empreendimento. A única coisa que o município não gostaria e vem buscando insistentemente é que esta diferença de valor não seja repassada ao munícipe, que é na verdade quem mais precisa do auxílio”, continua a prefeitura que ainda não tem uma estimativa da Caixa sobre um novo valor de financiamento. A administração municipal diz ainda que o governo estadual verifica a possibilidade de complementar o valor.
Em resposta ao questionamento do RD sobre as inscrições no Sihab continuarem sendo feitas, mesmo sem a aprovação da Caixa, prefeitura diz acreditar no programa. “Acreditamos que os obstáculos serão superados e que o valor final tende a ser fechado em breve pela Caixa, portanto não achamos que seria correto não dar a oportunidade das pessoas se inscreverem para um empreendimento futuro, já que ainda temos metade do empreendimento possível de ser comercializado. Estamos trabalhando para que quando a obra começar, seja feita com toda a segurança e siga até o final, porque sabemos que estamos tratando do sonho das pessoas”, diz a prefeitura, que conclui dizendo que o sistema de atendimento aos inscritos passou por problemas, mas já está funcionando.
Federal
O Ministério do Desenvolvimento Regional, responsável pelo programa Casa Verde Amarela diz que é a Caixa que deverá resolver o problema. “A Caixa Econômica Federal, na condição de operador do Programa Casa Verde e Amarela, é o órgão responsável por fazer a análise do empreendimento para contratação por meio do FGTS, assim como a análise do perfil das famílias para enquadramento nas faixas de renda do Programa. No caso das contratações dos financiamentos, o papel do MDR é na definição da Política Habitacional, bem como das regras e normas. Encaminhamos sua demanda à assessoria a Caixa para que a informação seja checada”, informou o ministério em nota.
A Caixa, também em nota, diz que o empreendimento Residencial João Ducin ainda não foi contratado. “A Caixa atua como agente financeiro do FGTS nas operações do Programa Casa Verde e Amarela e é responsável por realizar as análises de viabilidade técnica de engenharia, risco e jurídico das operações. Após as análises, efetua a contratação, o acompanhamento da obra, os desembolsos conforme evolução da obra e as contratações do financiamento habitacional com as pessoas físicas. A Caixa segue a regulamentação prevista pelo FGTS, PCVA e Banco Central, devendo as propostas de contratação atenderem aos requisitos exigidos e demonstrarem viabilidade econômico-financeira, visando a conclusão das obras e entrega das unidades aos seus adquirentes. Informamos que até o presente momento o Empreendimento Residencial João Ducin não foi contratado junto à Caixa”.
O RD não conseguiu contato com a construtora Sousa Araújo.