
Segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), nos 10 primeiros meses de 2021 as conversões de veículos para GNV (Gás Natural Veicular) subiram 102% na comparação com o mesmo período de 2020 – saltaram de 2.527 para 5.106 conversões. Isso acontece por conta do preço da gasolina e etanol. A guerra entre Rússia e Ucrânia deve contribuir para o cenário, pois grande parte do petróleo do mundo vem daquela região. Porém o número de carros movidos à gás é muito maior.
Dados da Angis (Associação Nacional dos Organismos de Inspeção) e do Sivesp (Sindicato das Empresas de Inspeção Veicular do Estado de São Paulo) dão conta de que 78% dos veículos abastecidos com GNV estão irregulares, ou seja, não passaram por inspeção e a conversão não é de conhecimento dos Detrans estaduais.
A gasolina comum custava em março de 2021, R$ 5,02 em média no Estado, agora o preço já chega a R$ 6,70 na média do ABC, uma alta de 33,5%. A situação está afastando consumidores e também já prejudica os estabelecimentos comerciais. De acordo com o presidente do Regran (Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do ABCDMRR), Roberto Leandrini Júnior, a única solução é a mudança na política de preços da Petrobras. “A perspectiva é de mais aumentos. A Petrobras tem que mudar a regra do jogo, enquanto os preços estiverem acompanhando o preço internacional vai continuar subindo e isso é ruim para todo mundo, para o consumidor e para o dono de posto”, comenta.
Aos poucos
Segundo Leandrini Júnior, para não repassar os aumentos de uma só vez, os postos adotaram a prática de repassar aos poucos, para não afugentar os clientes. “Os donos de postos reduziram ainda mais as suas margens e muitos não estão aguentando, já tem muito posto fechado. Se a política de preços não mudar o cenário pode ser bem pior. Tem motorista de aplicativo, por exemplo que deixou de trabalhar porque a empresa não repassa para a tarifa o aumento do combustível”, comenta.
De acordo com Wagner Souza, proprietário de postos em São Bernardo e Santo André, a queda já se vê nas vendas. “Ainda não tivemos um aumento oficial da Petrobras desde o início da guerra, mas ele deve vir. Mas o preço já está alto, em janeiro estávamos com movimento 15% abaixo do período pré-pandemia, de lá para cá, caiu bastante e hoje já estamos vendendo 30% menos comparado com antes da pandemia. Eu acredito que com aumento deve cair ainda mais. Se aumentar um real no litro, vai ser muita coisa e muitos postos vão quebrar, porque o posto vai ter que investir muito mais dinheiro para comprar combustível e as vendas, 70% delas, são feitas a prazo, no cartão de crédito. Com a redução das vendas e o produto mais caro, vai ter dono de posto que não vai aguentar”, analisa Souza que disse ainda que o mês de março tem um agravante; o dissídio dos frentistas. A folha vai aumentar e vamos precisar de ajuda do governo, como suspensão de contratos de trabalho, por exemplo, ou redução de jornada”, aponta.
Segundo Eric Gil Dantas economista do OSP (Observatório Social da Petrobras) e do Ibeps (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais), com as variações do barril do petróleo no mercado internacional, que já está em US$ 125, a gasolina deve aumentar mais. “A Rússia produz 14% do petróleo no mundo. Hoje o barril está em US$ 125 pode chegar a US$ 150, dessa forma acredito que o preço médio no Estado de São Paulo chegue a R$ 7,41 mais ou menos. O país está em uma situação em que precisa de uma solução macroeconômica”, analisa o economista.
Etanol
Na opinião de Dantas a alternativa energética mais viável seria o uso do etanol, cujo litro também tem acompanhado os aumentos da gasolina, mas ainda assim é mais vantajoso do que a conversão do veículo para GNV. “O Etanol tem mantido os 70% do preço da gasolina, ou seja, tem subido também, mas mesmo assim ainda é mais vantajoso do que a conversão do veículo para GNV”, alerta o economista que conclui: “O GNV está no foco da crise e pelos contratos com as distribuidoras ele também tem o preço baseado no barril de petróleo. Com o aumento da demanda, eu não acho que essa seja uma boa saída”.
Segundo Jeferson Molina, presidente da Angis (Associação Nacional dos Organismos de Inspeção) a conversão para GNV custa entre R$ 3,5 mil e R$ 6 mil, dependendo do carro e do kit instalado. O consumidor ainda vai gastar cerca de R$ 800 em inspeção e taxa do Detran para regularizar o carro. Ocorre que muitos motoristas optam por instalar kits paralelos em oficinas não credenciadas e consequentemente também não regularizam a situação do veículo.
“Fizemos um levantamento e constatamos que havia fila nas empresas de conversão, mas a mesma fila não se via nas empresas de vistoria. Aí fomos nos postos e constatamos que 78% dos veículos estavam irregulares, sendo 70% sem o GNV no documento do carro e 8% nem licenciados estavam. Falta fiscalização, um veículo com uma conversão mal feita, pode se tornar uma bomba. Recentemente tivemos um caso em Sorocaba no interior do Estado, que o carro explodiu no posto, felizmente não tivemos perdas de vida, como já ocorreu em outros acidentes”, conta Molina.
“A pressão em um sistema de GNV pode chegar a 300 bar, isso é muito, e uma falha numa válvula, num redutor ou em um cilindro pode causar um grave acidente. No Estado de São Paulo é lei e o proprietário tem que mostrar o selo de conversão no momento do abastecimento, mas ninguém cumpre porque não tem fiscalização e também já começaram a falsificar os selos”, relata Molina. Mas nem tudo é risco, se bem feita, a instalação pode garantir economia e, dependendo do uso do veículo, se pagar rapidamente. Segundo Molina a economia com o uso do GNV pode ser superior a 50%. “Por isso frotistas, taxistas e motoristas de aplicativo usam, mas é preciso que todos os órgãos, como a ANP (Agência Nacional do Petróleo) os IPEMs (Institutos de Pesos e Medidas) nos Estados, Detrans e também a polícia fiscalizem. Hoje quando um veículo é parado, não se verifica que o kit gás instalado está regularizado”, completa.