
O suicídio é uma das principais causas de morte no mundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, entre 700 e 800 mil pessoas morrem por suicídio no mundo a cada ano e esta é a quarta maior causa de mortalidade na população entre 15 e 29 anos. Considerado problema de saúde pública complexo e multicausal, possui impacto individual e social, que pode atingir pessoas de diferentes origens, gêneros, culturas, classes sociais e idades.
Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelam que o número de suicídios no Brasil em 2020 superou 12,8 mil, um aumento de 0,4% em relação a 2019. Os números seguem em elevação no País, em 2012, foram cerca de 6,9 mil casos.
Já um estudo realizado pelo Ministério da Saúde aponta dados mais elevados, mas que mantém o cenário de evolução dos casos em todo País. Segundo o último boletim epidemiológico sobre mortalidade por suicídio e notificações de lesões autoprovocadas, no Brasil, entre 2010 e 2019, ocorreram mais de 112,2 mil mortes e houve um aumento de 43% no número anual, que saltou de 9,4 mil mortes em 2010 para 13,5 mil em 2019.
A pesquisa aponta, ainda, que os homens apresentam um risco maior de morte por suicídio, enquanto entre as mulheres é maior a incidência de violências (lesões) autoprovocadas. A doutora em psicologia clínica Katia Pavani da Silva Gomes, docente do curso de psicologia da USCS (Universidade de São Caetano), alerta para as famílias prestarem atenção aos casos de violências autoprovocadas. “A tentativa de suicídio deve ser considerada como forte indicativo de que o mesmo venha a acontecer. Deve-se buscar orientação profissional, como tratamento psiquiátrico e psicológico. A família e amigos podem auxiliar estando presentes e disponíveis no que puderem para cuidar da pessoa”, orienta a psicóloga.
Quanto aos fatores que podem desencadear o quadro, Katia explica que não são inúmeros os causadores, mas há agravantes. “Segundo Neury José Botega, psiquiatra, o maior número de suicídios acontece em pessoas com transtornos mentais. O uso de álcool e drogas também é um fator importante a ser considerado e algumas características podem aparecer de forma muito acentuada, como agitação e sintomas de depressão. A combinação desses fatores pode agravar o risco”, afirma.
Dados no ABC
No ano passado, em duas cidades da região, Santo André e São Caetano, foram registradas 41 mortes decorrentes ou sequelas de lesão autoprovocada. Em São Caetano, foram 8 casos registrados, com maior incidência entre o sexo masculino (foram seis homens e duas mulheres). Quanto às notificações de violências autoprovocadas, a incidência é maior entre o sexo feminino.
Em 2021, foram registradas 37 notificações, sendo 10 homens e 27 mulheres. Em 2022, já foram contabilizados cinco casos de lesões autoprovocadas, sendo um homem e quatro mulheres. Nos dois últimos anos, as notificações têm maior incidência entre moradores de 20 a 34 anos.
Em São Bernardo, o cenário se repete. No ano passado foram registradas mais de mil notificações e lesões autoprovocadas entre moradores da cidade. A incidência é maior entre mulheres, com cerca de 68% dos casos. Em 2022, já foram registradas 291 notificações e a maior incidência é entre moradores com idades entre 10 e 29 anos.
Quanto a incidência maior de lesões autoprovocadas entre mulheres, Katia alerta para as questões de desigualdade de gênero. “Também assim como a de violência doméstica, as questões referentes a desigualdade de gênero explicitam o sofrimento das mulheres por violências de diferentes origens, o que por muito tempo “naturalizou” a violência contra a mulher e o sofrimento decorrente dessa. Enquanto houver uma sociedade que trata a mulher como ‘objeto’ haverá violência contra as mulheres e sofrimento”, afirma.
Em Santo André, o cenário se inverte e a incidência de lesões autoprovocas e mortes em decorrência dessas violências é maior entre os homens. Em 2021, foram registradas 251 notificações, 70% dos casos entre o sexo masculino e com idades entre 15 e 30 anos. No mesmo período, a cidade registrou 33 mortes em decorrência destas violências, com incidência maior entre homens e idades entre 25 a 34 anos. No primeiro trimestre de 2022, foram 89 notificações de lesões autoprovocadas.
Segundo levantamento do Ministério da Saúde, em 2019, do total de notificações cerca de 71% dos casos foram mulheres e 29% homens. No mesmo período, a faixa etária com maior incidência foi entre 20 e 39 anos, com 46,3% dos casos.
Serviços de acolhimento
Cidades da região ofertam serviços e ações de prevenção ao suicídio. Em São Caetano, o munícipe adulto que necessite de acompanhamento psicológico ou psiquiátrico, de acordo com protocolo de classificação de riscos, pode ser acolhido no CAPS (Centro de Apoio Psicossocial) II “Dr. Ruy Penteado” ou CAPS AD “Zoraide Maria Rampasso”. Não há a necessidade de encaminhamento. Crianças e adolescentes recebem a mesma assistência na Unidade de Saúde da Criança e do Adolescente (USCA) Amabili Moretto Furlan. No ano passado foram realizados, somente pelo CAPS II Dr. Ruy Penteado, mais de 11,4 mil atendimentos psicológicos.
Casos classificados como demanda leve de saúde mental podem ser acompanhados pela rede de atenção básica (nas unidades básicas de saúde, com os médicos de família); Centros Integrado de Saúde e Educação da Terceira Idade (CISE); além de serviços especializados como o Centro de Atenção à Saúde da Mulher (CAISM) e Centro de Prevenção e Assistência às Doenças Infecciosas (CEPADI). A cidade conta ainda com um pronto socorro de emergências psiquiátricas e equipe de psicologia hospitalar.
Em setembro de 2020 Santo André implantou o Fluxo de Cuidado às Tentativas de Suicídio. A entrada de todas os casos é sempre pela UPA (unidade de pronto-atendimento). Todos os pacientes são obrigatoriamente encaminhados para a emergência psiquiátrica do Centro Hospitalar e, após avaliação médica e psicológica, para as unidades do Centro de Apoio Psicossocial (CAPS).
São Bernardo informa, em nota, que após a notificação do caso, o paciente é encaminhado a um dos nove CAPSs para avaliação multiprofissional e tratamento.
Outras cidades
Em Diadema, munícipes que necessitem de acolhimento podem procurar a Unidade Básica de Saúde mais próxima da residência ou uma das unidades do CAPS. Os endereços estão disponíveis no site da Prefeitura. Em situações agudas, o atendimento pode ser realizado no pronto-socorro do Hospital Municipal (avenida Piraporinha, 1.682).
Ribeirão Pires oferece atendimento nos três CAPSs da cidade: Infantil (avenida Fortuna, 320), CAPS AD – Álcool e Drogas (rua Domingos Benzenuto, 12) e Adulto (rua Afonso Zampol, 41), de segunda a sexta-feira, das 8h às 16h. Em nota, a Prefeitura informa que no primeiro bimestre de 2022, mais de 7,3 mil pessoas passaram pelos serviços psicológicos da cidade.
Para Katia Pavani, as cidades devem focar em políticas públicas de saúde mental voltadas à prevenção desde a primeira infância. “Para que se possa perceber, atender e acompanhar as pessoas com transtornos mentais assim que os primeiros sinais aparecem. A imprensa tem um papel primordial ao divulgar e orientar sobre o que são as doenças mentais, como elas acontecem, o alcance que têm por acometer todo e qualquer tipo de pessoa e que quanto antes forem tratadas menor será o prejuízo de toda a população”, diz.
Centro de Valorização da Vida
O CVV — Centro de Valorização da Vida promove serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar. O atendimento é feito sob total sigilo e anonimato. Os contatos com o CVV são feitos pelos telefones 188 (24 horas e sem custo de ligação) ou pelo site www.cvv.org.br, por chat e e-mail.
Além dos atendimentos, o CVV oferece material de apoio para ações de prevenção ao suicídio. No site da entidade, é possível encontrar vídeos, artigos e manuais sobre o tema, destinado a jovens, pais e educadores.