
Em uma nota conjunta divulgada nesta terça-feira (20/12) as prefeituras de São Bernardo, São Caetano e Ribeirão Pires, oficializaram a saída do Consórcio Intermunicipal do ABC. Essa é a segunda vez que o colegiado de prefeitos enfrenta uma debandada de prefeituras, a primeira foi em 2017, quando o então prefeito de Diadema, Lauro Michels (PV) anunciou que a cidade se retiraria do grupo. Na época outras cidades, como São Caetano e Rio Grande da Serra, também ensaiaram o mesmo caminho, mas em 2019 o Consórcio conseguiu reagrupar os sete municípios após acordo sobre os repasses mensais.
Tanto em 2017 quanto agora, o argumento das cidades é a economicidade de recursos. “Diante de um modelo obsoleto e da pouca produtividade do Consórcio, as prefeituras acreditam que os recursos empenhados mensalmente à entidade serão melhor aplicados diretamente nos municípios, com mais investimentos em saúde, educação e segurança pública. Os altos custos da mensalidade do Consórcio não são compatíveis com a realidade dos municípios. E, além disso, o Consórcio não conseguiu suprir os anseios das cidades perante ao Governo do Estado e Federal”, afirmaram os municípios em nota.
Apesar do anúncio das prefeituras o desligamento da entidade regional não é automática. Os membros do colegiado devem elaborar a solicitação que deve ser votada em cada uma das Câmaras municipais e depois disso formalizado a saída oficial ocorre 180 dias depois.
O Consórcio Intermunicipal foi criado há 32 anos; ele foi idealizado pelo prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), que foi seu primeiro presidente. Daniel foi assassinado em 2002. A entidade, que passou a ser o primeiro consórcio multissetorial de direito público e natureza autárquica do país em fevereiro de 2010, conquistou no mesmo ano o direito de receber repasses estaduais e federais para programas e projetos que atendam às prioridades dos municípios consorciados, além de lançar processos licitatórios e articular parcerias com outras entidades.

O anúncio dos municípios aconteceu exatamente no dia em que o prefeito de Mauá, Marcelo Oliveira (PT) foi eleito para comandar o Consórcio Intermunicipal, sucedendo o prefeito andreense, Paulo Serra (PSDB). O também petista, José de Filippi Júnior, chefe do Executivo de Diadema, será o vice. Com o resultado da eleição, Mauá volta a assumir a presidência do órgão intermunicipal pela segunda vez e após 22 anos. “O Consórcio é o mais importante órgão representativo da nossa região. Agradeço a todos os prefeitos das cidades vizinhas pelo apoio confiado a mim. Juntos vamos lutar pelas sete cidades, buscando protagonismo e desenvolvimento para o ABC”, afirmou Marcelo Oliveira.
Na nota enviada pelo Consórcio que trata da nova presidência não há menção sobre a manifestação de saída de São Bernardo, São Caetano e Ribeirão Pires, porém foi relatado um longo histórico de ações da entidade regional que trouxeram muitos avanços para a região, nas áreas de Saúde, Mobilidade e de combate às enchentes.
O doutor em Educação e docente da UFABC (Universidade Federal do ABC) nas áreas de filosofia política e ética, Daniel Pansarelli, diz que os prefeitos que agora decidem sair da entidade regional parecem esquecer todo o passado de conquistas que o Consórcio trouxe para a região e que o custo que terão na busca de recursos e investimento em políticas públicas de forma isolada irá custar muito mais caro do que a mensalidade paga ao órgão regional.
“Os prefeitos se esqueceram dos problemas que a região tinha antes do Consórcio existir. Eram problemas imensos no trânsito, com os semáforos nas divisas das cidades que não eram sincronizados e geravam congestionamentos enormes, na gestão do transporte também haviam problemas, então se esqueceram do que já representou e representa um órgão que congrega as cidades”, analisa o docente da UFABC.

Para Pansarelli um fator primordial e que é característica do Consórcio foi esquecido pelos prefeitos; que o colegiado é supra partidário. Apesar dos prefeitos alegarem economicidade e a falta de resultados para a saída da entidade, para o professor ficou clara a discordância política. “O anúncio da saída vem logo após a eleição nacional e também na sequência da eleição interna (que colocou na direção da entidade dois prefeitos petistas). Não acredito que a saída tenha a ver com o modelo do consórcio, tanto que cidades saíram e depois voltaram. Independente do modelo, o Consórcio responde à demanda da região, com uns GTs (Grupos de Trabalho) mais ativos ou menos ativos dependendo da época. Na UFABC, por exemplo, estamos com uma parceria com o GT de Educação para a capacitação de professores das redes municipais, nos cursos que a universidade oferece”, aponta.
Para o professor a região, com a redução de cidades consorciadas, vai ter problemas maiores principalmente em áreas estruturais como na de mobilidade, de prevenção de riscos como enchentes e deslisamentos e nos planos diretores. “Obras do metrô e a mobilidade urbana em geral foram conquistadas através do Consórcio então, isoladamente, as prefeituras terão um prejuízo muito grande. Sair significa uma economia burra, porque será muito mais difícil conquistar esses investimentos estaduais e federais. Vai custar muito mais caro do que a mensalidade paga para o Consórcio”.
Apesar da redução de sete para apenas quatro cidades, caso os Legislativos venham aprovar a intenção de saída, o professor da UFABC não acredita no fim do Consórcio Intermunicipal, mas ele terá que se reestruturar financeiramente para compensar a receita menor. “Eu não acredito que o Consórcio venha a tombar, porque ainda há espaço para um atuação regional significativa. O poder de negociação de Santo André, Diadema, Mauá e Rio Grande da Serra ainda é forte com os governos estadual e federal, mas, sem dúvidas, a entidade terá que enxugar sua estrutura. Eu espero as cidades possam voltar a conversar, para que se reveja essa posição”, conclui.
Ao contrário do que analisa o professor da UFABC, o presidente da Câmara de São Caetano, que dirigiu interinamente o município durante praticamente todo o ano de 2021, Tite Campanella (Cidadania), disse que sempre foi contra o consórcio e o definiu como um cabide de empregos e um ‘monstrengo que suga dinheiro público’. O pronunciamento do parlamentar sobre o colegiado foi no momento em que ele anunciou, nesta terça-feira (20/12), que pretende disputar o cargo de prefeito em 2024.

Campanella começou fazendo referência à situação do passado em que a cidade chegou a anunciar a saída do Consórcio depois recuou. “Espero que essa decisão seja irreversível. Que a gente saia definitivamente do Consórcio, que é uma máquina pesada, uma máquina cara e que, infelizmente, não entrega aquilo que promete entregar. Então eu espero que a gente não volte mais, já saímos uma vez, então espero que agora seja uma saída definitiva. Eu acho que desde a sua concepção o Consórcio era mais um projeto de poder do que um projeto e integração dos sete municípios, um projeto que se esperava ser replicado nacionalmente para que se tirasse as características dos municípios menores para uma liderança maior, então eu sempre fui contra esse processo”, declarou.
O presidente do Legislativo sancaetanense disse que a divergência política levou a saída das três cidades. Ele defendeu ainda que o Consórcio seja esquecido. “Há mal que vem para bem, então que essa divergência política sirva para a gente esquecer essa experiência do Consórcio e a gente vai estar aqui na Câmara apoiando essa decisão do prefeito Auricchio. A gente já teve boa integração no ABC sem criar um monstrengo pesado que suga dinheiro público, conseguiu-se trazer a Companhia Telefônica da Borda do Campo e Estação de Tratamento de Água, sem ter esse organismo que custa caro, emprega um monte de gente e não entrega aquilo que a gente espera”, completou.
Veja abaixo a íntegra do posicionamento das três cidades
NOTA À IMPRENSA CONJUNTA ENTRE OS MUNICÍPIOS DE SÃO BERNARDO, SÃO CAETANO E RIBEIRÃO PIRES
Após inúmeras tentativas em devolver o protagonismo ao Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, as prefeituras de São Bernardo, São Caetano e Ribeirão Pires oficializam, nesta terça-feira (20/12), que se desligam da instituição.
Diante de um modelo obsoleto e da pouca produtividade do Consórcio, as prefeituras acreditam que os recursos empenhados mensalmente à entidade serão melhor aplicados diretamente nos municípios, com mais investimentos em saúde, educação e segurança pública.
Os altos custos da mensalidade do Consórcio não são compatíveis com a realidade dos municípios. E, além disso, o Consórcio não conseguiu suprir os anseios das cidades perante ao Governo do Estado e Federal.
Desta forma, o posicionamento é para viabilizar ações concretas, com economicidade do dinheiro público.