“Se isso ocorre com meu filho, que é um caso famoso e mora na região central, imagine com outras crianças”, palavras de Renato Trevellin, 46, pai do menino Gianlucca Trevellin, 10 anos, portador de uma doença rara chamada AME (Atrofia Muscular Espinhal), um conhecido caso que comove quem acompanha sua trajetória e que ganhou notoriedade em todo país. Entretanto, um mês após o início do ano letivo na rede municipal de ensino, em Santo André, a criança segue sem a indicação de um professor domiciliar por parte do governo Paulo Serra (PSDB).
O pequeno Gian se tornou conhecido por meio dos esforços de seus pais Renato e Cátia Trevellin, 46, que enfrentaram todos os obstáculos para que o filho tivesse direito ao tratamento da doença por meio do medicamento Spinraza, produto de alto custo aprovado nos Estados Unidos, em 2016. Ambos lutaram contra o Ministério da Saúde pelo direito à compra e ao fornecimento da medicação, que na ocasião tinha valor anual estimado em R$ 2 milhões.
Após intensas batalhas e 21 viagens a Brasília, hoje Gian recebe tratamento adequado e faz de pequenos movimentos, triviais a qualquer pessoa, um grande salto para sonhar mais alto na vida. Sua história, que ganhou destaque na mídia nacional e ajudou a outras crianças com a AME a terem acesso ao medicamento. A doença é degenerativa e interfere na produção de proteínas essenciais aos neurônios motores, responsáveis por nos fazer andar, comer, falar e respirar, mas com o procedimento correto, há a reposição do gene a fim de impedir a progressão da enfermidade.
Seis anos após iniciar o tratamento da AME, os pais de Gian agora lutam por um direito básico: a educação. Depois do início das aulas em 6 de fevereiro, a criança, que reside na Vila Assunção e está na 5ª série do Ensino Fundamental, matriculada na Emeief (Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental) Carlos Drummond de Andrade, Vila Pires, não teve a escolha de um professor domiciliar e hoje tem a sua grade curricular atrasada, ao mesmo tempo em que vê sua irmã mais velha, Giovanna, 13 anos, indo à escola.
Não foi por falta de aviso

“É um total descaso. Acho que deveriam respeitar mais as crianças com deficiência que precisam das aulas domiciliares e estou muito triste por isso. Ele quer aprender e ter aula. Lembro em um dia que fomos ao planetário do (Parque do) Sabina e o professor fez algumas perguntas e, do jeito dele, respondia primeiro que outras crianças. Estou implorando que ele tenha aula, porque é uma criança que quer aprender. E não há preço que pague o que ele aprende e passa para a gente”, diz Cátia.
Além de procurar a Prefeitura de Santo André e até vereadores, Cátia e Renato externaram a situação nas redes sociais, como na página do Facebook “Gianlucca Trevellin um guerreiro contra a AME”. “As aulas do nosso município começaram no início do mês de fevereiro e passado, mais de um mês, o nosso filho ainda está sem professora para atendimento domiciliar, por ser portador de deficiência deveria ter prioridade, mas não tem e isso é inclusão ou exclusão?”, questiona a publicação.
A reclamação dos pais é que todo ano, Gian nunca começa as aulas do período letivo ao mesmo tempo dos demais alunos. Sempre houve atrasos, porém, nunca passado um mês de indefinição, como ocorre agora. “O Gian está acostumado ver profissionais da Saúde (no dia a dia). Então (a presença de uma professora) é algo que muda completamente a rotina dele, porque tem contato com uma pessoa diferente”, diz Renato.
Segundo os pais, Gian adora Biologia, algo que fica claro por não desgrudar de uma aranha de pelúcia, personagem de um desenho animado. Mesmo com mobilidade reduzida, a criança passa tempo no computador, surpreende Cátia e Renato, ao tirar uma selfie direto do monitor. Com uma educadora, ele pinta e ouve histórias que permitem sua mente ir além das paredes de seu quarto.

Com 10 anos, ele é uma criança que faz questão de tomar banho e vestir o uniforme escolar para receber a professora. Sempre observador ao seu redor, Gian olha para a irmã Giovanna com mochila e faz questão de ter a sua, com estojo, lápis, giz de cera e outros materiais escolares. “Fica claro no semblante dele o quanto está feliz. Há dia que ele fica até emocionado para ter aula”, afirma Cátia, que promete não desistir até seu filho ter direito à educação.
Graças ao tratamento contra a AME, Gian consegue mover os olhos, fica de pé sem respirador por alguns minutos e faz atividades com computador. A cada pequeno movimento nos dedos dos pés e das mãos, uma grande alegria transborda nos corações de Cátia e Renato. “São coisas simples, mas para quem tem a AME, não há preço e temos a felicidade a cada dedinho que ele levanta”, fala Renato ao resumir esse sentimento.
Nota da Prefeitura
Em nota, a Secretaria de Educação de Santo André informa que, em tratativa com a família do aluno, acordou tentativa de adaptação da criança, às quintas-feiras, na unidade escolar. Após essa situação, segundo a Pasta, os pais de Gianlucca solicitaram atendimento domiciliar.
O governo do prefeito Paulo Serra ainda ressaltou que está em busca de um profissional de ensino regular que amplie sua carga horária para o atendimento na casa do aluno e que a unidade escolar entrará novamente em contato com a família, a fim de se colocar à disposição para uma reunião em caráter emergencial.
A administração municipal afirma que atualmente 12 crianças recebem atendimento domiciliar no município, não havendo nenhum caso não deferido ou aguardando deferimento.
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