
Uma morte violenta seguida de tentativa de ocultação do corpo que foi parcialmente carbonizado. Assim foi o desfecho do caso evolvendo Yago Henrique França, de 29 anos, que saiu de casa, em São Bernardo, no dia 27 de fevereiro, para um encontro amoroso marcado através de um aplicativo de encontros e não foi mais visto. Seu corpo queimado foi encontrado à beira de um córrego em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo, na terça-feira (07/03). Para Marcelo Gil, fundador e presidente da ONG ABCDS (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual), não há dúvida que foi um crime de homofobia.
Nesta quarta-feira (08/03) a ABCDS enviou ofício para a Secretaria Nacional de Segurança Pública onde pede providências para que as empresas donas de aplicativos apresentem os dados à polícia para a apuração de casos de extorsão e crimes contra a população em geral e, especialmente, contra o público LGBTQIA+. Gil cita no documento situação em que o WhatsApp ficou inoperante por decisão do Supremo Tribunal Federal, até ceder informações. O aplicativo de mensagens instantâneas tem sua sede no exterior, assim como os aplicativos de encontros, tais como Tinder, Hornet, Scruff, Grindr, entre outros.
“Solicitamos tal emergencialidade da cooperação destes aplicativos e que sejam tomadas as devidas providências em gerar segurança em um campo obscuro virtual. Esses aplicativos não exigem dados seguros para a sua utilização. Há casos de prostituição paga e extorsão contínua e o aplicativo diz que pune, mas é uma inverdade. Ocorrem nestes aplicativos casos de extorsão e sequestro vitimando vidas em casos de homofobia e transfobia, onde esses assassinos esses aplicativos que hoje são terreno sem lei”, cita a organização não governamental no ofício enviado à SNSP.
“O Yago foi para um encontro através de um aplicativo, no último diálogo com uma amiga ele disse que estava empolgado com o encontro e não sabia ao certo de onde era o rapaz com quem se encontraria”, relata Gil. O presidente da ABCDS aponta ainda que a polícia não fez tudo que poderia ter feito. “Não foi feita uma varredura nas câmeras, o rastreio da conta bancária foi feito pela própria família e não pela polícia. O reconhecimento do corpo aconteceu porque a família foi ao IML, não foi a polícia que chamou”, aponta.
O caso de Yago é mais um que, segundo a ABCDS não fica configurado como crime de homofobia. Segundo Gil a polícia não está preparada para lidar com esses casos. “A população de gays está sendo vítima de um grande número de extorsões. Os encontros são marcados pelos aplicativos, sem que a vítima tenha conhecimento de que seria um encontro pago. Depois do encontro, o golpista mostra o perfil alterado no aplicativo com um valor pelo programa. Recebemos pelos nossos canais 75 queixas deste tipo de golpe só esse ano. Sem falar nos casos em que a vítima chega ao local do encontro e é assaltada ou sequestrada”, diz o presidente da ONG ABCDS.
A Secretaria de Segurança Pública não informou quantos casos de morte por motivo de homofobia foram registrados nos últimos dois anos. Sobre o caso de Yago relatou apenas a localização do corpo e que o caso foi registrado como morte suspeita pela Delegacia de Itapecerica da Serra, que solicitou perícia e exame necroscópico à vítima. “Foi um crime de ódio, sem dúvida, porque tentaram queimar o corpo, desfigurar a vítima, levaram os documentos e o celular. O Yago era muito voltado à cultura, muito participativo e sua morte deixa toda a comunidade muito triste”, lamenta Marcelo Gil. Yago se apresentava como ator e se apresentava como a Drag Queen Amélia Lovett. Ele também era tarólogo.
“Não existem políticas públicas de segurança para a população LGBT, quando o Yago sumiu, acionei o Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), mas me falaram para procurar a delegacia de desaparecidos. Temos esses números crescendo de casos de extorsão e essas vítimas não vão à delegacia por medo ou vergonha”, diz. A ONG orienta a quem for marcar encontro, o fazer em uma área de grande circulação de público, se possível em um shopping center e nunca levar a pessoa que se acabou de conhecer para a própria casa. A organização elaborou até uma cartilha de orientação. (Veja abaixo)