
A medicina avançou muito na sua parte tecnológica, sobre tudo nestes últimos anos por conta da pandemia da covid-19, isso é inegável, e um legado que fica é a consulta médica virtual ou telemedicina. Os serviços públicos de saúde estão adotando cada vez mais essa prática. No dia 13/04 a Câmara de Ribeirão Pires aprovou projeto de lei que autoriza a realização desse tipo de atendimento na rede de saúde da cidade. A Câmara dos Deputados e o CFM (Conselho Federal de Medicina) também já disciplinaram a consulta virtual, porém a prática não é unanimidade na classe médica.
As cidades que já implantaram o serviço de telemedicina na região relatam avanços principalmente na redução das filas por atendimentos em especialidades. A prefeitura de São Caetano, por exemplo, implantou o serviço em agosto do ano passado com o objetivo de dar conta de milhares de consultas represadas por conta da pandemia. A cidade conseguiu tirar o atraso do atendimento graças à telemedicina. “São cinco salas de atendimento no Complexo Hospitalar de Clínicas e mais três no Atende Fácil Saúde. O munícipe é agendado, vai ao local e é acompanhado por equipe de enfermagem que faz uma triagem, exames são escaneados e encaminhados ao médico para análise, até o fim da consulta, quando receitas e encaminhamentos são impressos para o morador. Recentemente agregamos ao atendimento de telemedicina, os exames a distância. O tytocare realiza sete tipos de exames e auxilia principalmente cardiologistas, dermatologistas e otorrinolaringologistas nos diagnósticos dos pacientes”, explica o paço sancaetanense sobre o procedimento.
A telemedicina de São Caetano atendeu de 800 a 900 consultas por semana. “Já ultrapassamos 22 mil atendimentos em 13 especialidades médicas: alergologia, cardiologia, cardiologia pré-operatório, cirurgia vascular, dermatologia, endocrinologia, hematologia, nefrologia, neurologia, otorrinolaringologia, pneumologia, psiquiatria, reumatologia e urologia. O custo de implantação foi de R$ 40 mil mais o contrato mensal de R$ 270 mil com a empresa prestadora dos serviços de telemedicina que disponibiliza toda equipe médica (35 profissionais), suporte e equipamentos tytocare ara exames a distância”, informa a prefeitura.
Como vantagens a prefeitura diz que a maior delas foi eliminar a fila. “Iniciamos a implantação da telemedicina com as sete especialidades que tinham a maior demanda represas por conta da pandemia, tínhamos 12.173 consultas represadas. Entre agosto e dezembro realizamos 13.224 consultas, equalizando a demanda. Em janeiro ampliamos para 13 especialidades atendidas e hoje, temos Fila Zero (ofertas maiores que as demandas) em dez das 13 especialidades. Os pacientes aprovam o atendimento, a rapidez entre marcação e atendimento, além do acolhimento.
São Bernardo iniciou um projeto piloto para implantação do serviço de telemedicina e esse teste, segundo a administração, trouxe efeitos positivos. Agora a cidade realiza licitação para novo serviço. “Com o novo recurso, espera-se reduzir as filas de espera, diminuir o tempo para os atendimentos especializados e diagnósticos, diminuir o absenteísmo das vagas ofertadas e evitar deslocamentos desnecessários de pacientes. Bem como diminuir o diagnóstico tardio de doenças que evoluem com comorbidades e internações”, relatou a prefeitura em nota.
A prefeitura de Diadema relatou que dentre as melhorias feitas no atendimento, uma delas é a implantação de dispositivos que possibilitem o teleatendimento e teleconsulta. “Durante o período mais crítico da pandemia, algumas UBSs (Unidades Básicas de Saúde) adotaram com sucesso o teleatendimento como recurso de assistência, principalmente nos casos de monitoramento dos casos positivos de covid-19. “A telemedicina é mais um recurso complementar à assistência médica e não necessariamente exclui a consulta presencial, que será realizada sempre que o médico entender necessário. Sua utilização será normatizada por protocolos clínicos”, diz nota da prefeitura.
Santo André iniciou projeto-piloto de telemedicina no dia 28/02 na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) da Vila Luzita. Durante o mês de março passaram pelo serviço 764 pessoas, que foram atendidas por médico virtual com apoio físico de um enfermeiro. “O período de diagnóstico do projeto-piloto termina no fim do mês de maio, quando serão analisados os indicadores de atendimento e os resultados. Após a análise destes dados, a Secretaria de Saúde vai decidir quais outras unidades vão receber as salas de teleatendimento”, diz informe da prefeitura.
Na UPA o paciente é encaminhado para uma sala especial do serviço, onde um enfermeiro conduz a interação com o médico clínico, que é feita por meio de um computador, equipado com câmera de alta definição. O local também conta com outros recursos, como impressora na qual o médico pode solicitar exames e indicar medicações que são ministradas na própria unidade. Neste momento de implementação o serviço funciona das 7h às 19h.
A prefeitura de Mauá informou que não tem previsão para implantar e Rio Grande da Serra, não respondeu. Ribeirão Pires ainda não possui o serviço de telemedicina, mas a implantação deve ocorrer em breve. Segundo informou a prefeitura os estudos se encontram em estágio avançado. O projeto aprovado na Câmara e agora segue para a sanção ou veto do prefeito Guto Volpi (PL).
Mecanismo não conta com apoio integral da classe médica
Se a telemedicina é considerada um avanço e uma forma de reduzir as filas de esperas no sobrecarregado serviço público de saúde, por outro lado, há críticas sobre o método de atendimento. Para o médico e professor de cardiologia da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), Adriano Meneghini, a prática pode trazer mais problemas que soluções.
“Talvez a telemedicina possa ser usada, mas não como uma primeira avaliação médica. A relação médico-paciente se baseia em uma forte relação de confiança e a medicina se desenvolveu em torno desse binômio e não acredito que isso possa se estabelecer em uma consulta em que se tem uma história contada pelo paciente, mas não se tem um exame físico. É como um médico que fica atrás da mesa, que nem olha para o paciente e só pede exames. A telemedicina vai aumentar isso. Me assusta essa história de coloca o médico como se fosse um atendente de telemarketing”, sustenta Meneghini.
“Como um paciente pode ser examinado numa consulta online? Uma situação diagnosticada como crise de gastrite pode mimetizar um infarto, pois os sintomas são muito parecidos. Quando praticada no primeiro atendimento ao paciente a telemedicina se torna um exercício de adivinhação. Por isso fica difícil entender o que há de bom nisso (telemedicina)”, continua o professor da FMABC. O cardiologista considera que o serviço público vai ganhar em redução das filas, mas dificilmente conseguirá mensurar os resultados na saúde dos pacientes com a telemedicina. “Os pagamentos na saúde pública são muito ruins, por isso as filas são grandes porque não tem médico. Se não tem no posto de saúde vai ter na telemedicina? Eu vejo que o resultado pode ser pior. A prefeitura fará o marketing de que não tem mais fila, mas e a saúde dos pacientes, melhorou? Qual a resolubilidade?”, indaga o médico.
Meneghini considera que, como uma forma de acompanhamento do paciente que já é conhecido do médico, a consulta virtual pode ser uma ajuda. “A academia vê com muita ressalva a telemedicina, o entendimento é que ela vai distanciar o médico do paciente. Eu vejo mais uma situação para baratear o custo da saúde porque o salário na telemedicina é menor. No meu caso, que tenho 35 anos de atuação, eu não colocaria, por valor nenhum a minha experiência como médico na telemedicina”, conclui.