
Durante os meses mais frios do ano os diagnósticos mais comuns nas unidades de saúde são relacionados ao sistema respiratório, que sofre com a baixa umidade do ar, alterações bruscas de temperatura e aumento da poluição atmosférica, fatores preocupantes para portadores de doenças respiratórias crônicas.
O tema da saúde respiratória de crianças e o papel da inovação no contexto da melhoria da vida das que convivem doenças dessa natureza motivou a pesquisa de Claudia Tavares Alvarenga, especialista em fisioterapia respiratória e terapia intensiva neonatal e pediátrica e co-fundadora da GetinOxy, Health Tech startup voltada para soluções em saúde da respiração.
Em nota técnica publicada na 26a Carta de Conjuntura da Universidade de São Caetano do Sul (USCS), Claudia aborda aspectos de razões históricas do uso da terapia inalatória e sua evolução, bem como desafios atuais na sua adesão especial mente pela população pediátrica. Ela destaca a importância da curadoria do conhecimento para pais e cuidadores e o papel da inovação em contribuir para melhor manejo dessa gestão.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as infecções respiratórias e doenças pulmonares obstrutivas crônicas matam cerca de 6.4 milhões de pessoas por ano. A crescente incidência e prevalência de quadros respiratórios em bebês e crianças atualmente nas grandes metrópoles é notória.
Segundo a pesquisadora esse cenário se deve a fatores diversos como predisposição genética, contaminação viral e também a poluição atmosférica, uma ameaça à saúde em todo o mundo. “Em crianças por exemplo, a poluição pode comprometer o desenvolvimento pulmonar e predispor a uma maior fragilidade do sistema”, afirma Claudia.
Ela aponta em seu estudo que além da emissão de gases poluentes na atmosfera, a própria mudança climática contribui para a poluição. Fenômenos como o aumento das temperaturas e dos níveis de dióxido de carbono na atmosfera fazem com que o pólen se acumule, agravando os casos de asma na infância. De acordo com a OMS, entre 11% e 14% das crianças com 5 anos ou mais sofrem os sintomas da doença e cerca de 44% dos casos estão relacionados a exposições ambientais insalubres.
De acordo com o Global Asthma Report, relatório com contribuições de 97 especialistas de 31 países para reduzir a asma e facilitar seu manejo, a asma, doença inflamatória dos brônquios e que não tem cura, acomete 339 milhões de pessoas em todo o mundo com estimativa de esse número ser ainda maior, podendo chegar à média de 400 milhões em 2025. Estima-se que no Brasil a prevalência média de asma ativa em adolescentes seja de 18,5%3.
“Bombinhas” – A pesquisa de Claudia Tavares Alvarenga aponta que meados dos anos 50 surgiram as “bombinhas” que revolucionaram a intervenção medicamentosa prometendo tratar doenças respiratórias com ação local de corticoides e broncodilatadores, mais rápida e efetiva. Mas a dispersão acentuada de partículas acabaram sendo desafios a serem superados principalmente pela população pediátrica. A década de 70 trouxe a otimização da entrega do aerossol às vias aéreas inferiores, por meio do desenvolvimento de câmaras compostas de um reservatório tubular que, colocado entre a boca do paciente e o inalador dosimetrado (“bombinha”) promoviam a retenção do aerossol até a inalação das partículas do fármaco com maior efetividade aumentando assim em até duas vezes a deposição pulmonar.
A pesquisa aponta que o tratamento agudo e crônico preventivo pela terapia inalatória de fármacos pode melhorar significativamente a vida de crianças e adolescentes que sofrem com essas desordens. Segundo a Iniciativa Global para Asma, organização médica que providencia linhas orientadoras e trabalha com saúde pública e profissionais de saúde em nível global para diminuir a mortalidade pela doença, as “bombinhas” associadas a dispositivos como câmaras espaçadoras são a terapia de primeira escolha.
Mas também há desafios relacionados à sua adesão, como o monitoramento e forma correta de utilização, implicando em recorrente ineficácia de controle de crises além de efeitos adversos relacionados à terapia incorreta. A simples manutenção e manuseio do dispositivo espaçador inalatório é capaz de influenciar no seu correto funcionamento, e contaminações bacterianas foram detectada em 35% de espaçadores de crianças asmáticas.
Insegurança
Pais e mães não se sentem seguros quanto à correta desinfecção ou até mesmo esterilização, ficando a critério de fabricantes, divergentes em parte da literatura científica, a recomendação sobre utilização e cuidados.
Segundo a pesquisadora Claudia Tavares Alvarenga as pessoas recorrem frequentemente a meios rápidos de informação como vídeos, mídia social de profissionais de saúde quando não ao mesmo pessoalmente ou por meio de telemedicina. Estudo demonstra que o conhecimento teórico prático de profissionais de saúde do Hospital da Criança no Estado de São Paulo a respeito do uso de inaladores pressurizado mostrou ser heterogêneo. Médicos residentes, fisioterapeutas e médicos assistentes obtiveram desempenho significativamente melhor que enfermeiros e auxiliares de enfermagem sendo que estes últimos estão diretamente envolvidos na aplicação prática desses dispositivos na rotina hospitalar.
A inserção das mães no mercado de trabalho trouxeram menor presença no ambiente domiciliar e maior permanência de crianças por períodos mais longos nas escolas, o que dificulta a sequencia do tratamento inalatório de seus filhos quando em fase aguda.
Tendo em vista este cenário, a nota técnica conclui pela clara a necessidade de auxiliar não somente crianças, bebês e adolescentes em todo o processo da terapia inalatória, mas também profissionais de saúde e principalmente mães e pais, ou tutores, pelo uso da inovação e recursos tecnológicos a fim de promover a curadoria do conhecimento, maior acesso, autonomia e controle da doença e seu tratamento.