Segundo levantamento feito pelo Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), a cada hora, três crianças são abusadas sexualmente no País. A estatística se torna ainda mais alarmante quando se nota que 85% dos casos são de pessoas próximas às vítimas, sendo 65% familiares das crianças e adolescentes.
Para entender os dados, como o abusador age e de qual maneira a situação aflige o comportamento dos jovens abusados, em entrevista ao RDtv, a presidente do Sindpesp, Jacqueline Valadares, comenta sobre os números alarmantes e a necessidade do apoio a criança e ao adolescente para combater o crime.
Veja a entrevista abaixo:
RD: Qual é o perfil do agressor?
Jacqueline Valadares: Assim como mostram os dados, são principalmente pessoas com quem as crianças tem vínculo de parentesco, envolvendo, por exemplo, pai, padrasto, irmão e tio. Infelizmente, não existe um perfil pré-definido. O que podemos definir, assim como os dados mostram, são pessoas próximas às crianças. Geralmente, essa pessoa é dada como acima de qualquer suspeita, ou seja, bem relacionada no círculo familiar, sem antecedentes criminais, inserida no mercado de trabalho e que, através desses fatores de confiança, aproveita para praticar o abuso. Não é alguém que gera alerta vermelho.
RD: O que mais dificulta a tratativa desses casos?
Jacqueline Valadares: A criança tem muita dificuldade em denunciar esse tipo de agressor porque é alguém com quem ela convive e tem um relacionamento familiar. Além disso, quando esse jovem denuncia, existem casos de resistência por parte da família em acolher essa denúncia. Ao dizer para a mãe, ela se recusa a acreditar que o marido ou tio da criança esteja praticando a ação.
RD: Quais são os sinais de que uma criança ou adolescente está sofrendo com abusos?
Jacqueline Valadares: É comum que esses jovens apresentem sinais que precisamos usar como referência e até como alerta. Quando o crime é praticado em casa, normalmente a criança passa, por exemplo, a ter uma certa resistência em ficar sozinha com aquele parente, bem como começam a apresentar quadros de regressão, como voltar a usar chupeta ou fazer xixi na cama, além do medo de dormirem sozinhas, isso sem contar com lesões físicas como manchas pelo corpo e machucados nas regiões genitais. É importante que pessoas ao redor dessa criança, inclusive no ambiente escolar, saibam interpretar e notar esses sinais.
RD: Como identificar o agressor?
Jacqueline Valadares: É importante que seja dada credibilidade à palavra da criança. Temos que pensar “Por que uma criança mentiria a respeito de um abuso?”. Quando um jovem relata o incidente a algum adulto, por vezes ele não consegue nem como expressar o que de fato acontece. É possível que a criança diga que tal pessoa a beija em locais inadequados, faz cócegas em locais que a deixam desconfortável. Não podemos colocar em xeque os relatos, e deixar a criança dizer o que ela sente, sem impor novas informações.
RD: E sobre os abusos que acontecem no ambiente escolar?
Jacqueline Valadares: É outro ambiente em que recebemos algumas denúncias. Existe por vezes uma relação próxima entre o professor e o aluno, que faz com que o abusador gere ainda mais proximidade. Geralmente são alunas, dos 11 aos 13 anos, que obedecem ao professor, que abusa disso para tirar proveito pela hierarquia. O assédio começa sorrateiramente, com o professor pedindo o número da aluna, elogiando e se aproximando, logo começa a pedir fotos e marcar encontros, o que faz com que a aluna se submeta ao professor por ter medo de ser prejudicada em sala de aula.
RD: Campanhas existentes são suficientes para combater os abusos?
Jacqueline Valadares: Acredito que precisamos de campanhas intensas e ininterruptas. Estamos no Maio Laranja, o qual é o mês de conscientização sobre o tema, mas é importante que essa temática seja trabalhada ao longo do ano. Existe um número gigantesco de crianças e adolescentes que não reportam quando sofrem o abuso. Por isso, não podemos nos limitar a abordar sobre esse tema apenas uma vez por ano, e sim constantemente nas escolas, nas famílias, pois existem diversas maneiras de discutir sobre o tema sem gerar desconforto. Vejo que falta bastante sobre esse tipo de crime, é importante haver essa conscientização.