ABC - sábado , 29 de junho de 2024

Mesmo com condenação confirmada pelo TSE, Auricchio deve concluir mandato

Prefeito José Auricchio Júnior sofreu derrota no TSE, que rejeitou seu recurso, mantendo a condenação de primeira instância. (Foto: Letícia Teixeira / PMSCS)

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) validou na quarta-feira (20/06) a condenação do prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior (PSD) por captação irregular de recursos na campanha de 2016. O seu vice na chapa daquele ano, Beto Vidoski (PRD), também foi condenado. A penalidade imposta é de oito anos de inelegibilidade à partir de 2016, ou seja, vence neste ano, porém, segundo análise de especialista, ainda cabe recurso e o prefeito deve concluir o seu mandato mesmo condenado. A assessoria do chefe do Executivo disse que ele vai recorrer.

O TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo entendeu que houve arrecadação ilícita de recursos financeiros de campanha por José Auricchio por meio do uso de doadora sem capacidade financeira para fazer o repasse. O relator do processo no TSE, ministro Nunes Marques, destacou que “a expressão captação ilícita abrange tanto a ilegalidade da receita em si quanto o modo de obtenção dos recursos financeiros. Desponta como exemplo mais conhecido o que se convencionou chamar de ‘Caixa 2’, o fluxo de numerário que, a despeito de financiar de fato os atos de campanha, corre à margem do sistema legal de fiscalização, seja porque deixou de ser contabilizado, seja porque foi falsamente escriturado”, afirmou o relator.

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O RD mostrou em reportagem de 2017 que a aposentada Ana Maria Comparini Silva, moradora de Jundiaí, não conhecia Auricchio, mas na contabilidade da campanha eleitoral do ano anterior ela teria sido a doadora de R$ 293 mil para a campanha. A casa simples no município de Jundiaí, demonstrava já que a mulher não tinha condições financeiras para fazer doação deste vulto. A legislação diz que a doação para campanha é limitada a 10% do rendimento bruto declarado no Imposto de Renda, para isso Ana Maria deveria ter uma renda bruta de R$ 2,9 milhões. À reportagem ela negou ter renda milionária. Ela é mãe de uma funcionária da Globo Contabilidade que é a empresa que cuidou das contas de campanha.

Outra doadora foi Maria Alzira Garcia Abrantes que doou R$ 350 mil para a campanha. Aposentada, tinha como única renda sua aposentadoria do INSS. A suposta doadora estava internada na época da campanha e morreu no ano seguinte aos 90 anos.

Recurso

Em nota encaminhada por sua assessoria, Auricchio disse que vai recorrer. “A íntegra do acórdão ainda não foi publicada e o prefeito irá recorrer da decisão. Ressaltamos, porém, que essa decisão é sobre a eleição de 2016. Portanto, não há impacto no mandato vigente”, diz o comunicado.

Para o advogado Antonio Carlos de Freitas Jr, que é mestre em Direito Constitucional pela USP e especialista em Direito Eleitoral, a decisão não afeta o mandato atual do prefeito do PSD por ela não se referir ao atual mandato e porque ainda cabem recursos. “Na realidade, o atual prefeito de São Caetano não está inelegível pelo caso da doação eleitoral ilegal de 2016. Para que se tornasse inelegível, a decisão que o condenou deve transitar em julgado, isto é, não pode haver mais recurso cabível no caso. Todavia, a decisão condenatória ainda não transitou em julgado, tendo em vista que cabe recurso ao próprio TSE e ao STF. Por outro lado, Auricchio não corre risco de ser cassado antes fim do mandato, isto porque o próprio TSE entendeu, em 2021, que essa condenação não o impediria de disputar as eleições de 2020 e assumir o cargo de prefeito. Em outras palavras, o prefeito corria risco de ter sido cassado no seu primeiro mandato após a condenação, porém, recursos apresentados impediram que esse fosse o caso, de modo que Auricchio cumpriu aquele primeiro mandato mesmo condenado”, analisa.

Advogado Antonio Carlos de Freitas Júnior, especialista em direito eleitoral. (Foto: Divulgação)

Segundo Freitas Júnior, a condenação de inelegibilidade por oito anos já se torna inócua diante dos recursos da defesa do prefeito. “De certa forma pode ser considerada inócua tendo em vista que a perda do primeiro mandato (decorrente da eleição onde houve ilegalidade) não ocorreu, o que foi causado pela apresentação de recursos pelo prefeito, os quais postergaram os efeitos da decisão. Quanto ao segundo mandato, o TSE entendeu, em 2021, que Auricchio deveria ser empossado como prefeito tendo em vista que não haviam provas de que este tenha participado ou anuído com a doação ilícita à sua campanha. Isto é, ainda que condenado com relação a 2016, o TSE entendeu que essa condenação não interferiria no exercício do segundo mandato.

Quanto ao caso da doação recebida em 2016 cabem dois recursos a Auricchio, segundo explica o especialista em direito eleitoral. “Embargos de Declaração, que serão analisados pelo próprio TSE e que visam apenas corrigir alguma obscuridade ou contradição na decisão e; Recurso Extraordinário, que será analisado pelo STF, no qual a defesa do prefeito deverá alegar que a decisão recente do TSE viola a Constituição Federal, o que, caso reconhecido pelo STF, pode reverter o julgamento a favor do prefeito”, explica José Carlos de Freitas Júnior.

Condenação será combustível para oposição na campanha eleitoral

Os opositores do prefeito José Auricchio Júnior (PSD) devem aproveitar a condenação na justiça eleitoral, mesmo que ainda caibam recursos, para atingir a gestão do chefe do Executivo e principalmente o candidato governista à sucessão, Tite Campanella (PL). O vereador que já foi prefeito interino enquanto a Justiça decidia se o pessedista poderia assumir, não quis comentar a condenação e nem os efeitos dela na futura campanha.

Jair Meneguelli. (Foto: Reprodução/RDTv)

Para o pré-candidato pelo PT, Jair Meneguelli, é muito provável que Auricchio consiga concluir o mandato, o segundo após a campanha colocada sob suspeita e isso traz uma sensação de impunidade segundo sua leitura. “É bem capaz dele ainda entrar com algum recurso e é capaz até de passar a eleição de outubro. O que chama a atenção é que ele, no dia da condenação estava com o filho o Alianz Park assistindo o Palmeiras jogar, não demonstrando preocupação, isso para mim é fazer pouco caso dos munícipes, ele poderia ao menos demonstrar alguma preocupação”, disse.

Para Meneguelli o Judiciário tem parte na culpa pelo prefeito, condenado pela captação irregular de recursos seguir por dois mandatos sem que a punição de oito anos de inelegibilidade de fato fosse efetuada. “Não quero crer que o Judiciário aceite qulquer tipo de interferência dependendo do caso a Justiça é mais rápida para uns e mais lenta para outros que têm bons advogados. Por isso acho que a justiça tem um pouco de culpa e por isso o Auricchio está tão tranquilo, com certeza da impunidade”, diz o petista. Para o pré-candidato certamente essa situação será pautada na campanha pelos candidatos de oposição. “Vamos tentar mostrar que o Auricchio e o Tite são farinha do mesmo saco que vêm administrando a cidade de forma não transparente”, completa.

Professor Rafinha. (Foto: Reprodução/RDTv)

Para Rafael Ferrari, o Professor Rafinha (PSol), a situação de condenação de José Auricchio Júnior vai respingar no seu candidato a sucessão, Tite Campanella (PL). “O Tite está envolvido em tudo isso, nessa gestão que pega recursos de empresas privadas para campanha usado nome de laranjas. O Tite foi líder do prefeito na Câmara e nunca tocou o assunto. Para piorar teve uma postura arrogante na votação escandalosa da semana em que foi votado aumento de 80% no salário de prefeito e secretários para o próximo ano e ainda deu um thauzinho debochando da população que lotava a câmara. Ele é diretamente interessado já que é pré-candidato a prefeito”.

Rafinha disse ainda que a notícia dessa confirmação de condenação de Auricchio vai respingar em seu candidato. “O Auricchio acabou privilegiado com a morosidade da Justiça, mas foi condenado, e o Tite não conseguirá descolar a sua figura política da imagem do prefeito”, completa.

Mario Bohm (Foto: Reprodução/RDTv)

Mário Bohm (Novo) considera que manutenção da cassação pelo TSE do mandato de Auricchio atinge a cidade como um todo. “Isso faz mais mal à cidade do que à campanha de quem quer que seja. A economia da cidade vai mal, a receita está caindo e a gente precisa elevar o nível da política porque empresas estão saindo da cidade, pois não querem estar vinculadas a uma cidade onde essas coisas acontecem. O próprio Tite veio falar do crescimento da arrecadação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), mas eu desmenti, os números provam que houve queda de 30%, e pode cair mais”.

Bohm também considerou a demora para o desfecho jurídico da questão prejudicial para a credibilidade da classe política e do próprio Judiciário. “Uma penalidade para trás, ou seja, para período já decorrido, nao tem nenhum efeito prático, é injusta. Na nossa futura campanha vamos focar no que isso traz de prejuízo para os moradores. Certamente o Tite terá reflexos disso e tentará expliar o que é quase inexplicável. Como é que ele vai dizer que a condenação está errada? Eu vejo que, por isso, a campanha será mais aguerrida e o jogo mais aberto na campanha deste ano”, completa.

Fabio Palacio (Podemos) não foi localizado para comentar o assunto.

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