
A construção de ciclovia e de calçadas permeáveis nos dois sentidos da avenida Goiás, com custo de aproximadamente R$ 20 milhões, continua a dar dores de cabeça à gestão do prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior (PSD). Depois de o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) abrir investigação e apontar que cerca de R$ 3,3 milhões foram gastos além do necessário, com itens não obrigatórios ou sobrepreço em materiais, agora apuração do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) constata novas irregularidades, conforme relatório assinado pela conselheira Cristiana de Castro Moraes.
O TCE iniciou investigação após acolher pedido do MP, que abriu inquérito civil para apurar possíveis irregularidades apontadas em representação do vereador Edison Parra (Podemos), procedimento que ainda está em curso. “Esse inquérito (do TCE) e essa investigação representam uma vitória do nosso mandato. Agora, vamos aguardar os desdobramentos. Se forem encontradas irregularidades, que os envolvidos sejam responsabilizados e que não haja prejuízo aos cofres da cidade”, diz o parlamentar nas redes sociais, após ter conhecimento do relatório inicial do órgão estadual.
Segundo apurado pelo TCE, um dos orçamentos usados pela Prefeitura foi elaborado por uma empresa que não possui cadastro na Receita Federal nem na Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp), além de apontar diferenças nas quantidades de três itens na comparação entre o apresentado nos orçamentos e no edital.
“Três itens que deveriam compor a proposta constaram dos orçamentos pesquisados com as quantidades de 720, 6 e 4 unidades, enquanto no edital são de 582, 7 e 5. Além disso, na elaboração do orçamento a Prefeitura utilizou a mediana das cotações, com exceção do item 1.2.6, para o qual foi utilizada a média”, escreveu a conselheira.
Empresa do Amazonas
O apontamento do TCE diz ainda que as cotações dos três itens foram apresentadas pelas empresas Luiz Carlos Bressan Júnior, que no CNPJ constou o nome fantasia BRtran Soluções Viárias “não localizado por esta fiscalização nos registros da Jucesp e Receita Federal”, Localiza Sinalização Viária e Constpark Construção de Edifício, sediada em Manaus (AM). “Não consta dos autos o motivo pelo qual a Prefeitura consultou preços de empresa de outro Estado, ao invés de procurar algo que efetivamente refletisse a realidade local”, consta no documento do TCE.
Ainda com relação aos três orçamentos, o TCE também levanta dúvida sobre as propostas apresentadas pelas empresas Luiz Carlos Bressan Júnior e Localiza, tendo por base uma ‘coincidência’. “Os dados das cotações não se mostraram confiáveis, visto que as duas propostas apresentam o mesmo erro ortográfico”, relata.
Por fim, o TCE questiona como a Prefeitura definiu os preços de referência dos pisos de concreto permeável instalados na avenida Goiás, “que juntos representam 22,75% do total orçado para a obra”. Esses apontamentos, do Tribunal de Contas e do Ministério Público, indicam que pode haver irregularidade na contratação. “Das pesquisas de preço encartadas (no processo licitatório), não foi possível elucidar como a administração obteve os preços de referência para esses dois itens (pisos nas cores clara e escuro, ambos de 8 cm)”, aponta.
Valores
A obra da ciclovia foi orçada em R$ 11.557,405,16 e a das calçadas verdes, ou permeáveis, em R$ 8.409.452,48. A CLD Construtora, Laços Detetores e Eletrônica Ltda foi a vencedora da concorrência pública nº 05/2022. Somados, os valores chegam a aproximadamente R$ 20 milhões para execução das intervenções em 5,8 quilômetros dos dois sentidos da avenida Goiás, o que significou investimento de R$ 3,4 milhões a cada mil metros, valor que chamou a atenção.
Para efeito de comparação, em 2016, o então prefeito de São Paulo e atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, gastou em torno de R$ 650 mil por quilômetro na construção de ciclofaixa.
O valor despendido pelo governo Auricchio para tocar a obra foi o que levou o vereador Edison Parra a fazer representação junto ao MP, que acolheu o pedido de investigação e instaurou inquérito civil. A partir disso, a promotora de Justiça Maria Fernanda de Lima Esteves pediu ao CAEx (Centro de Apoio à Execução) do MP-SP, para elaborar um laudo técnico sobre as intervenções, que apurou que do total de quase R$ 20 milhões, R$ 1.365.500,00 foram gastos com equipamentos que não são obrigatórios ou indispensáveis para o funcionamento seguro da ciclovia.
A análise do contrato pelo órgão apontou ainda divergências na composição do BDI (Benefícios ou Bonificações e Despesas Indiretas), que teriam gerado distorções desfavoráveis ao erário público da ordem de R$ 599.404,29.
A análise técnica apontou, ainda, ocorrência de sobrepreço nos itens de serviço relacionados ao piso drenante das calçadas verdes, da ordem de R$ 1.404.859,84. Ao todo, segundo o laudo do CAEx, o prejuízo foi de R$ 3.369.764,13, mostrou reportagem publicada pelo RD em fevereiro de 2024.
Questionada sobre se já teve acesso aos apontamentos do TCE e se tomou alguma providência no que se refere a encaminhar explicações, a Prefeitura de São Caetano não se posicionou até o fechamento desta reportagem.