
Para a bióloga e pesquisadora da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Marta Marcondes, a poda correta, o distanciamento entre árvores e fiação de energia além do plantio de espécies adequadas para calçadas, poderiam ter evitado os acidentes com a rede elétrica que deixaram mais de 3 milhões de imóveis na Grande São Paulo sem energia, alguns deles por quase uma semana. A especialista diz que as equipes não são preparadas e os poderes públicos não têm sequer um inventário de suas árvores.
Marta Marcondes afirma que a manutenção é feita de forma errada, se coloca cimento até o tronco da árvore, sem respeitar o espaço de terra ao redor da árvore. “As pessoas que moram em frente à árvore também precisam cuidar dela. A poda errada junto com esse cimento na base, desestabilizam a árvore. Todo mundo gosta da sombra que elas dão, do controle da temperatura, da manutenção da umidade, portanto a árvore também significa saúde para nós, mas falta educação para que as pessoas entendam isso”, explica.
O poder público, segundo Marta Marcondes, erra em não ter um plano de arborização com espécies corretas para áreas urbanas, por isso algumas com raízes maiores quebram calçadas, muros e causam problemas nas casas. “A árvore não é a vilã, uma espécie adequada e uma poda correta poderiam ter evitado grande parte dos problemas que tivemos com o temporal do dia 11. Essas podas têm que ser programadas com a Enel, que corta a luz naquele trecho e pessoal preparado da prefeitura vai lá e faz a poda, mas tem que ser gente preparada, não é qualquer um que faz isso. Ninguém capacita esse pessoal; se a poda fosse feita direito muitos prejuízos teriam sido evitados. É importante saber que a árvore precisa estar balanceada, o tamanho da copa tem de ser compatível com seu tronco e raízes. Se isso não for considerado e os municípios não fizerem um inventário, vamos continuar vendo tragédias, e pior, com potencial perda de vidas”, completa.
A moradora de Mauá, Ana Paula Nascimento Maia, diz que teve um problema com a poda da árvore que fica em frente a sua casa na Vila Nova Mauá. Ana pediu em junho, a poda por uma razão de segurança, já que temia que pessoas pudessem se esconder sob a sombra da árvore para cometer algum delito. Por sorte o pedido, que demorou, acabou sendo atendido e a prefeitura cortou os galhos mais baixos e também liberou a fiação que passava pela árvore. “Se não tivesse sido podada, teria danificado a fiação, que passa bem perto dela. Graças a Deus não tive nenhum problema, aqui não faltou energia, nem água”, comentou. Apesar da poda ter resolvido o problema da moradora, a árvore ficou com galhos mais para um dos lados.

A mesma sorte não teve Leandro Rocha, morador do Rudge Ramos. O protocolo de pedido para a poda da árvore que fica em frente à sua casa data de 2018. “Fizeram uma poda superficial, alegando que quem deveria fazer o restante seria a Enel com o desligamento da rede porque os galhos estão entre os fios. Com isso a poda que fizeram não adiantou de mais nada porque já cresceu tudo. Entrei em contato com a prefeitura, que fala que é responsabilidade da Enel, a gente fala com a concessionária que alega que precisa de liberação da prefeitura e fica esse empurra empurra. Além da falta de poda a árvore está puxando meu muro, piso da calçada está todo elevado. Tenho problema com o entupimento das calhas com as folhas, pois a árvore está muito alta, moro num sobrado e ela está mais alta que a casa”, conta.
A rua onde Rocha mora ficou sem energia entre sexta-feira, dia do temporal, e o sábado. Não foi possível saber se há alguma influência da árvore no problema elétrico, mas o morador disse que em outras ocasiões já viu ocorrerem curtos na rede por conta dos galhos que tocam a fiação.
Prefeituras
O RD indagou as sete prefeituras sobre as podas de árvores e se há um inventário de quantos exemplares arbóreos cada cidade tem e de quais espécies. mas só três municípios responderam. E destas, só uma tem levantamento preciso sobre a cobertura verde de sua área.
São Bernardo tem um estudo sobre quantas árvores a cidade tem. “O município conta com aproximadamente 218 mil árvores. Por mês, são recebidos, em média, 500 pedidos de poda pela população, volume abaixo da capacidade. Em 2024, já foram realizados 11.278 serviços do tipo até o momento. A solicitação para podas de árvores pode ser feita de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, pelos telefones (11) 2630-7350 e 0800-7708-156. Após o recebimento da solicitação é feita a análise da demanda e vistoria, quando cabível. Quando os galhos das árvores estão em contato ou próximos da rede de energia elétrica classificada como ligação primária, somente a concessionária Enel pode executar a poda. Neste caso, é emitido ofício à empresa solicitando a poda com prazo de 90 dias para execução. Com relação ao temporal da última sexta-feira (11/10), foram atendidas 140 ocorrências, entre árvores e galhos caídos pela cidade”, informa em nota.

Ribeirão Pires não informou quantas árvores há em calçadas e terrenos públicos. “A Prefeitura atende de 70 a 90 pedidos de poda por mês, sem que necessite de autorização da Defesa Civil. Atualmente, o serviço de poda de árvores é dividido por urgência e complexidade. A zeladoria se dedica a realizar a poda simples, enquanto a Defesa Civil acompanha intervenções que necessitam mais técnica. As ações são realizadas sempre com a anuência e sintonia de ambas equipes. Entre sexta e domingo (de 11 a 13/10) da ultima semana foram 20 ocorrências registradas após tempestade, todas atendidas pela Defesa Civil.
Diadema diz que aumentou em 210% a quantidade de podas nos últimos anos e culpa a Enel pelo índice de resolução não ser de 100%. “A Prefeitura já realizou, desde janeiro de 2021 até agora, 13.494 podas e cortes de árvores, média de 3.400 serviços realizados por ano. O número é 210% maior do que a média realizada na gestão anterior, de 1.100 serviços por ano. Desde agosto de 2022, quando o Colab foi lançado, até setembro de 2024, já foram recebidos 2.589 pedidos de cortes e podas de árvores. Pedidos que necessitem de desligamento da rede elétrica permanecem abertos até que a Enel faça o serviço, e por isso, o índice de resolução não é de 100% dos atendimentos”, diz nota da prefeitura.
O município chegou a ficar com 80% do seu território às escuras após o temporal do dia 11. Alguns lugares, segundo a administração municipal, ficaram mais de 72 horas sem energia.
Mauá, Santo André, São Caetano e Rio Grande da Serra não responderam.