O consumo de metanfetamina para potencializar o prazer sexual, prática conhecida como chemsex (abreviação de chemical sex, ou “sexo químico”, em português), tem se tornado cada vez mais comum no Brasil e preocupa especialistas. A tendência, que surgiu na Europa nos anos 2000, se disseminou nos últimos anos no país e, apesar de representar um grave problema de saúde pública, ainda recebe pouca atenção da sociedade e de órgãos governamentais. Médicos alertam que, sem medidas urgentes, a situação pode se transformar em uma epidemia.
Em entrevista ao RDtv, o psiquiatra Danilo Baltieri, docente da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), destaca os riscos do uso de metanfetamina injetável, considerada a substância mais associada ao chemsex. Segundo ele, a droga é utilizada por cerca de 85% dos adeptos da prática, seja de forma inalada, fumada ou injetada.
O uso intravenoso, em especial, representa um risco ainda maior. Além dos danos causados pela substância, há um alto risco de contaminação por doenças como HIV e hepatite, já que muitas vezes as seringas são compartilhadas. “O que preocupa é a volta de um ciclo que já vimos no passado, especialmente na época da epidemia de HIV e AIDS. O uso de drogas injetáveis nunca deixou de ser um problema, mas agora retorna com força”, alerta Baltieri.

Outro fator de risco do sexo químico é o comportamento desinibido dos usuários, que se expõem a relações sexuais desprotegidas. A excitação extrema causada por substâncias como a metanfetamina reduz o senso de risco, fazendo com que muitos não utilizem preservativos ou outras medidas preventivas.
Embora a tendência tenha surgido no público LGBTQIA+, Baltieri afirma que estudos recentes indicam que a prática já se disseminou entre diferentes grupos sociais e faixas etárias. A maioria dos casos ocorre entre pessoas de 21 a 29 anos. Além disso, o acesso à metanfetamina, antes restrito a grupos de maior poder aquisitivo, se ampliou. Parte da droga consumida no Brasil vem do México e dos Estados Unidos, tornando-se mais acessível a diferentes camadas da população.
A dependência psicológica causada pelo chemsex é um dos principais desafios para aqueles que tentam interromper a prática. Muitos usuários relatam que não conseguem mais ter relações sexuais sem o uso da substância, o que favorece recaídas. “Os pacientes frequentemente perguntam se conseguirão ter prazer sem a droga, e a resposta inicial deles mesmos é ‘não’. Isso demonstra o grau de dependência criado pelo uso contínuo dessas substâncias”, explica Baltieri.
Para ele e outros especialistas, a situação é preocupante, especialmente pela falta de estrutura de apoio no Brasil para tratar esse tipo de dependência. O país ainda está atrasado no combate à metanfetamina e não dispõe de medidas eficazes para conscientização ou tratamento dos usuários. “Falta tudo. Essa questão foi esquecida, e estamos lidando com um problema crescente sem ferramentas adequadas para enfrentá-lo. Sem apoio profissional e políticas públicas eficazes, esses usuários continuam presos nesse ciclo perigoso”, conclui o psiquiatra.