
O mercado internacional está em polvorosa e as bolsas de valores do mundo sentiram os efeitos das medidas protecionistas do presidente americano Donald Trump que impõe uma taxação maior para os produtos de fora. Os produtos brasileiros serão taxados em 10%, o que deve impactar os volumes enviados para os EUA, originários de empresas de todo o Brasil e não será diferente com o ABC. O comércio exterior entre o ABC e os Estados Unidos chegou a US$ 1,159 bilhão em 2023 e é um mercado muito importante para os produtos da região. O mercado americano consome da região basicamente, máquinas, peças automotivas, pneus, petróleo, cobre e derivados.
Somando importações e exportações de empresas do ABC para os Estados Unidos a movimentação financeira passa de US$ 1,159 bilhão, segundo dados de 2023 que constam no portal Data Viva da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Naquele ano a região exportou US$ 605,8 milhões e importou US$ 554 milhões. A região carece de dados mais recentes e detalhados e, agora com o Tarifaço, os Ciesps (Centros das Indústrias do Estado de São Paulo) buscam aprimorar as informações.
Para o diretor do Ciesp de São Bernardo, Mauro Miagutti, ainda é cedo para fazer previsões do que pode acontecer, mas o primeiro ponto é fazer um profundo estudo da relação comercial com os EUA. “Não temos um levantamento detalhado do que as empresas estão negociando com os Estados Unidos, a primeira providência nossa é saber quais empresas exportam, quais os setores e quanto vendem”, aponta. O estudo deve ficar pronto esta semana.
Anuar Dequech Júnior, diretor do Ciesp de Diadema, também concorda que ainda é cedo para saber das consequências que podem vir, porém ele acredita que depois que a poeira baixar, o produto brasileiro pode acabar favorecido. “Nós fomos taxados em 10%, mas outros países foram taxados em muito mais, então acredito que ainda estamos competitivos. Ainda não sabemos se tudo isso vai se consolidar, então penso que esse é um momento para ficarmos mais quietos e ver como o mercado vai reagir”, analisa. Para o empresário a dúvida monumental é saber como reduzir custos para compensar a tarifação extra e manter o preço do produto no mercado americano. “Estamos já numa pressão enorme dos custos do Brasil. Hoje se o cara conseguir baixar seus custos em 10% eu diria que ele é um herói, porque esse trabalho de otimizar os custos já é algo que fazemos rotineiramente. Tentar reduzir mais quando já estamos apertados vai nos deixar num beco sem saída”, aponta.
Apesar de acreditar que a indústria não enxerga mais onde pode enxugar seus gastos com a produção, Dequech Júnior prefere se apegar ao otimismo, no comparativo global. “Com 10% de tarifação estamos levando vantagem, até porque vai chegar um momento que os EUA não vão conseguir suprir o mercado dele sozinho, então penso que não vamos sofrer tanto e pode até ser bom para nós e o Brasil pode ser mais competitivo, o momento não é ara se apavorar com o mercado”, completa.
Para o gestor da Escola de Negócios da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), professor José Turíbio de Oliveira, o segredo é reduzir os custos de produção para compensar a tarifação e assim o produto brasileiro chega ao mesmo preço e não haverá perda. “Se o produto vendido é um item premium, o consumidor não vai deixar de comprar se o preço estiver 10% mais caro, mas se forem destinados a um público sensível ao preço pode ocorrer queda. As empresas então têm que reduzir o preço na sua cadeia de produção, seja com o transporte, seja com o valor do aluguel, seja com o custo da energia ou outros fatores. Não é fácil mexer, mas não é impossível”, aponta.
Oliveira diz que é preciso que haja pessoal especializado para fazer essas contas. “No caso de empresas que importam e exportam é possível usar Drawback que deduz impostos. O governo brasileiro já balançou a bandeira com mecanismos de proteção às empresas, mas os empresários têm que botar gente para medir a inflação interna para reduzir custos a curto prazo. Também é possível aproveitar o momento para otimizar o maquinário para produzir outros itens, buscar novos mercados. Se não está bom para vender para os EUA posso vender para o Chile. O ABC é um polo exportador importante e tem que encontrar mecanismos de sobrevivência e passar por esse momento”, diz o professor da USCS.
O maior exportador para os EUA no ABC, segundo os dados da Data Viva é São Bernardo. Em 2023 foram US$ 228 milhões exportados para aquele país, sendo que os produtos que vão para solo americano são basicamente cobre e derivados. O mercado americano representa 5,6% das exportações da cidade. No mesmo ano São Bernardo importou US$ 154 milhões.
Santo André exporta basicamente pneus, petróleo e peças para motores para os EUA. Em 2023 foram exportados o equivalente a US$ 120 milhões e os EUA representam 26% das exportações de empresas andreenses. No mesmo período foram importados US$ 113 milhões.
Ribeirão Pires exportou naquele ano US$ 116 milhões o que corresponde a 44% das exportações da cidade. Praticamente tudo que vai para os EUA é munição. Esse tipo de produto corresponde a 93% do que chega aos norte americanos vindos de Ribeirão Pires. A balança comercial com os Estados Unidos é bem desigual com a cidade do ABC, que importou apenas US$ 22,7 milhões em 2023.
Diadema tem no mercado americano o destino de 30% das suas exportações. A cidade mandou para os EUA mercadorias que somaram US$ 67,2 milhões sendo a maioria dos produtos máquinas pesadas para forja. Porém a cidade importou mais que exportou; foram US$ 71,6 milhões em importações dos EUA em 2023, segundo o Data Viva.
US$ 38 milhões foi o valor exportado por empresas de São Caetano para os EUA em 2023. Foram basicamente ferramentas e instrumentos de medição. Os EUA são destino de 4% de tudo que a cidade exporta. O município do ABC também importou mais que exportou, foram US$ 78 milhões em importações naquele ano.
Mauá exportou US$ 35,6 milhões em produtos para os EUA em 2023. O mercado americano consumiu hidrocarbonetos, petróleo e plástico da cidade do ABC e o país é o destino de 13% das exportações mauaenses. A importação também foi bem maior no período; US$ 114 milhões.
Rio Grande da Serra exportou US$ 1 milhão em 2023 para os EUA, em peças automotivas e importou US$ 690 mil.
Chicote
Para o professor de Economia da Universidade Metodista de São Paulo, Gustavo Monea, destaca o efeito chicote, que é quando há uma variação nos pedidos, que provoca uma ampliação da variação ao longo da cadeia. “Dá para notar, pelos dados, que a exportação das cidades do ABC para os Estados Unidos é coisa de 10% a 15%, só que tem cidades como Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra que exportam e têm uma ligação maior. O que quase ninguém viu é o impacto indireto, chamado de efeito chicote. Commodities e produtos químicos a gente manda para o mercado americano, mas aquilo de valor agregado a gente manda para mercados emergentes, como México, Colômbia, China e outros e estes são fornecedores do mercado americano. O que acontece é que se esse país não conseguir entrar no mercado dos EUA ele vai ficar com um déficit na balança comercial ou, como quer o presidente americano, ficar no empate, mas aí esse país, indiretamente vai ter o câmbio afetado, como também as remessas de lucro, e vai também deixar de consumir do Brasil. Por isso o que a região pode sentir de forma abrupta é um efeito sistêmico, não vamos sofrer o efeito direto como todo o mundo, mas um efeito sistêmico de um chicoteando o outro”, analisa.