ABC - sexta-feira , 18 de abril de 2025

Presença e diálogo são pilares da saúde mental na adolescência, diz psicóloga

Aclamada pela crítica e amplamente comentada nas redes sociais, a série Adolescência, da Netflix, ganhou destaque ao abordar temas como misoginia e cyberbullying. No entanto, a produção também traz à tona outras questões importantes, que provocam reflexões sobre o que significa ser adolescente nos tempos atuais, como lidar com as fases da vida e qual é o papel dos pais nesse processo – fundamentais para a construção de um diálogo verdadeiro.

A psicóloga Gleise Sales Arias, doutora em Psicologia Clínica e professora na Fundação Santo André, observa que a série vai além dos temas mais evidentes ao escancarar o abismo entre adolescentes e adultos. “É uma série sobre a escuta da adolescência. As dores de um adolescente ao perder uma amizade ou ser alvo de zombarias são tão reais e importantes quanto as enfrentadas por adultos. Mas, muitas vezes, esses sentimentos acabam sendo minimizados”, afirma Gleise em entrevista ao RDtv.

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(Foto: Reprodução/RDtv)

Falsa ideia de proteção

Um dos pontos centrais destacados pela psicóloga é a falsa sensação de segurança que muitos pais sentem ao saber que seus filhos estão dentro de casa. A série mostra que, mesmo confinados em seus quartos, adolescentes estão expostos a conteúdos violentos, situações de risco e interações tóxicas.

“A internet ampliou o processo de autonomia. Os filhos crescem, vivem relações, acessam conteúdos e constroem experiências emocionais que os pais, muitas vezes, desconhecem”, explica.

Gleise ressalta que a solução não está apenas na fiscalização, mas na construção de uma relação de intimidade desde a infância. Segundo ela, quando o vínculo é baseado apenas no controle, ele se torna frágil, pois a criança aprende cedo a burlar a vigilância. “O que realmente protege é o afeto e a presença constante no cotidiano”, afirma.

Outro aspecto relevante da série, segundo a psicóloga, é a relação entre o protagonista e seu pai. “É o retrato de um menino tentando corresponder às expectativas paternas. Isso gera medo, culpa e frustração”, comenta. Gleise reforça que os pais precisam compreender que os filhos não existem para atender expectativas, mas para viver suas próprias escolhas.

A distância emocional, segundo ela, muitas vezes impede que adolescentes compartilhem situações de bullying ou sofrimento psicológico — especialmente entre pais e filhos homens, por receio de serem vistos como fracos.

Escola e saúde mental

Embora a série destaque a dinâmica familiar, Gleise lembra que o desenvolvimento dos adolescentes ultrapassa esse núcleo e envolve também fatores sociais, amizades e outros relacionamentos. “Escolas, profissionais da saúde e políticas públicas precisam estar envolvidos na causa”, defende. Ela alerta que os debates sobre saúde mental costumam ganhar espaço apenas após crises — como ataques em escolas – quando o ideal seria investir continuamente em prevenção.

No contexto da saúde pública, a psicóloga enfatiza a importância do trabalho de profissionais da atenção primária. Para ela, o atendimento psicológico não deve ser procurado apenas diante de problemas, mas como uma forma contínua de cuidar da vida, das relações familiares e do desenvolvimento em todas as suas dimensões.

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